Em meio a pandemia surgiu em Campinas o “Angeli Dai in terris”, um grupo de serviços comunitário que distribui cestas básicas, sem vínculo político ou empresarial. Atualmente, o grupo acompanha 100 famílias e tem quase 300 na fila de espera. Cerca de 70% dessas famílias são de mães solo, conta Regina Fideli, umas das idealizadoras do projeto.
“Não são mães que tem uma, duas crianças. São mães, a maioria, que tem quatro, cinco, oito. Nós temos uma família que tem nove crianças. ”, explica Fideli. Muitas dessas mulheres são adolescentes ou jovens e tem mais de uma criança. A mais jovem tem 16 anos.
Surgimento do projeto
O Angeli Dai in terris completa dois anos de trabalho neste mês de junho. Formado por 11 voluntários, eles arrecadam alimentos e distribuem cestas básicas, produtos de higiene e, caso necessário, itens como roupas e móveis. Em plena pandemia, o grupo surgiu naturalmente, relata Regina Fideli:
“Tudo isso começou com uma criança. Essa criança, a mãe foi embora e o pai é catador de reciclado. Ela foi embora e ele ficou sozinho com o pai e o pai não tinha o que fazer com ele e o pai precisava sair para pegar reciclado porque é a renda da família. Ele levava o menino. ”
Então, sabendo das didiculdades que pai e filho enfrentavam, um pequeno grupo se uniu para ajudar a família e recebeu ajuda de algumas pessoas. Era o mês do aniversário da criança.
“Ele ganhou uma bicicleta nova, o pai tinha pedido uma cesta básica, chegaram dez. Ele ficou com uma, guardou uma para o mês seguinte e as outras ele dividiu com os vizinhos dele. Nós também juntamos roupas para os dois, tinha o suficiente para os dois e eles distribuíram também para a vizinhança inteira deles.", completa Regina Fideli.
No mês seguinte, as mesmas pessoas que ajudaram o pai e o menino, perguntaram se poderia colaborar novamente e que o grupo podia retirar as doações. Regina Fideli conta que ficaram confusos no início: “A gente falou: “Mas como assim pegar a gente passa aí para pegar? A gente não pediu nada.”. E aí, o grupo nasceu. Ele simplesmente nasceu. ”
Ação se sustenta sem apoio político ou empresarial
O grupo de serviço comunitário se mantém com pequenas doações. Não recebe grandes colaborações, os alimentos chegam em sacolas em mercado, aos poucos. Essa solidariedade de quem não tem muito pode ser vista até mesmo entre as famílias que são assistidas.
“São pessoas que nos procuram e na primeira oportunidade que elas têm de conseguir um trabalho, ainda que seja informal, como uma faxina, eles entenderam tanto nosso trabalho que eles nos avisam. Eles falaram: “Olha, eu consegui uma faxina em uma casa que eu vou trabalhar três vezes por semana, então a minha cesta básica você pode dar para outra família, que eu sei que tem outra família esperando. ””, conta Fideli.
O propósito do grupo, segundo Regina Fideli, é mostrar para essas pessoas que não estão sozinhas. Embora a pandemia tenha afetado muitas pessoas, atualmente a maior parte das famílias assistidas não são sequelas da pandemia. Eles vêm de uma pobreza hereditária, replicando o que viram com os avós e os pais.
“São pessoas, numa situação financeira muito desiquilibrada. Uma coisa muito desorganizada, mas não necessariamente por culpa deles. Por conta da realidade, do contexto que eles vêm. ”, completa, Fideli. Campinas, atualmente, tem mais 300 mil pessoas trabalhando sem carteira assinada. Em janeiro havia 2.454 novas vagas de emprego, em março este número caiu para 1.627, aponta o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED).
“A gente conseguiria atender o dobro de famílias, mas não é esse o objetivo. A gente não está preocupada em fazer volume, em mostrar que nós atendemos 250 famílias. Não. Porque estaríamos traindo o propósito do grupo. ”, afirma a voluntária, explicando que as cestas básicas são maiores que o padrão.
Como as cestas se adequam a necessidade das famílias, o grupo não consegue atender toda a demanda que os procuram pedindo ajuda. Afinal, existem família com até nove moradores e diversas crianças.
*Sob supervisão de Rose Guglielminetti.