Goleira do Corinthians, Kemelli superou crise de ansiedade para jogar semifinal

Jogadora comemora título brasileiro em primeira temporada como titular

Alinne Fanelli

Kemelli em atuação pelo Corinthians na final do Campeonato Brasileiro Feminino Livia Villas Boas/Staff Images Woman/CBF
Kemelli em atuação pelo Corinthians na final do Campeonato Brasileiro Feminino
Livia Villas Boas/Staff Images Woman/CBF

Aos 22 anos, Kemelli não se cansa de exibir a medalha de campeã brasileira. A goleira do Corinthians superou muitas dificuldades ao longo da carreira para ser coroada com esse grande momento na final vencida pelo alvinegro sobre o Palmeiras por 3 a 1, no último domingo.

Dificuldades não só dentro de campo, como as poucas oportunidades nas últimas temporadas: de 2017 a 2020, ela havia atuado 19 vezes entre os quatro clubes que passou, 3B da Amazônia, Flamengo, Santos e Internacional.

Fora das quatro linhas, o trabalho da psicóloga do Corinthians foi essencial para ela. 

Nascida em Petrópolis (RJ), ela assumiu a titularidade da equipe depois da lesão da Tainá Borges e chegou a revezar com a Natascha (que também se machucou) até ser escolhida por Arthur Elias como a dona da posição. Para segurar essa pressão, teve muito auxílio da Djara Fortes.

“O trabalho que ela fez comigo foi incrível. A gente não espera a lesão das goleiras, então, tive que assumir precocemente a titularidade e essa camisa é muito pesada, é uma cobrança maior. Eu sofro com ansiedade e foi um trabalho para que eu pudesse me manter bem mentalmente, estar bem nos jogos, porque eu tinha sintomas físicos que atrapalhavam meu desempenho”, conta Kemelli.

A goleira teve uma crise e por muito pouco não ficou fora do jogo contra a Ferroviária, na ida da semifinal. “Eu quase não consegui subir para o gramado porque eu tinha muita vontade de vomitar. Eu não estava me sentindo preparada, por mais que todo mundo falasse que eu estava bem, que tinha treinado. Minha mente dizia o contrário”, lembra.

Foi aí que Djara Fortes atuou e fez com que Kemelli tivesse forças para jogar. “Ela me chamou no campo, fizemos um trabalho e tudo o que aconteceu depois disso é história para contar. Quando eu cheguei na final, já era outra pessoa. Estava muito tranquila, muito segura do que todo o time podia fazer. Hoje, posso dizer que não estou 100%, mas sei controlar muito bem até onde posso ir, até onde minha mente pode me levar. É um trabalho necessário para nós, atletas, com as pressões que sofremos. Estou muito feliz pelo meu controle mental hoje.”

A goleira corintiana teve algumas dificuldades de adaptação quando chegou ao Corinthians por causa do estilo de jogo da equipe. “Aqui a goleira joga muito adiantada, é quase como uma zagueira, na verdade. Joga sempre com os pés, participa o tempo todo da construção do time. E foi uma adaptação um pouco acelerada por causa das lesões da Tainá e da Natascha, mas fiquei feliz com minha evolução e com o trabalho que o Edson Junior [preparador de goleiras] faz, que é sensacional. Muitas goleiras passaram por ele. Fiquei feliz por ter sido escolhida pelo Arthur. O trabalho é muito bem feito, todo mundo se conhece muito bem e as coisas começam a dar certo porque a gente trabalha muito aqui. A receita do sucesso é essa: trabalho”, destaca.

Falta de reconhecimento

Kemelli precisou esperar muito para conseguir ter uma sequência na carreira e, segundo ela, o período sem jogar foi de muito aprendizado. “A gente acaba se frustrando muito porque somos as primeiras a chegar e as últimas a sair. E acaba sendo frustrante você estar ali todo dia se dedicando e não tendo oportunidade, muitas vezes não tem o reconhecimento que você queria. Mas eu aprendi muito, cresci muito como pessoa e como atleta, aprendi a esperar meu tempo. Goleira só joga uma e dificilmente há a troca. Trabalhei muito em silêncio, quietinha, aprendendo com as mais velhas, porque eu tenho só 22 anos e a gente sabe que o goleiro amadurece mais tarde, começa a pegar bagagem com 25, 26 anos. Posso dizer que tenho bagagem, já passei por base de seleção brasileira e clubes grandes. Aprendi muito, amadurecendo, trabalhando com pessoas diferentes e pude conquistar minha vaga este ano.”

A corintiana comentou que gostaria de ser convocada para a seleção brasileira, mas sabe que para isso precisa ter regularidade e se destacar no Corinthians. “Se eu fizer um bom trabalho aqui, consequentemente pode vir uma convocação. Espero estar lá e voltar aqui com você falando como convocada. Quero chegar aqui e poder mostrar essa medalha para todo mundo, dizer que eu venci. Todo o trabalho foi feito da melhor forma para coroar o nosso esforço. Eu tenho sonhos grandes, quero conquistar tudo o que eu puder, seja pelo Corinthians seja pela seleção, quero escrever meu nome aqui. Sem pisar em ninguém, respeitando a história de todo mundo, para poder mostrar para aos meus filhos, netos, as medalhas, os vídeos, os jornais”, finaliza.