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Guerra da Rússia contra a Ucrânia completa 6 meses

Cidades ucranianas retomam a rotina, mas não há perspectiva de paz

Bruno Capozzi e Isabela Mota

Guerra completa seis meses Reuters/Alexander Ermochenko
Reuters/Alexander Ermochenko

No mesmo dia da independência ucraniana, a invasão promovida pela Rússia completa 6 meses. A previsão inicial de que Kiev seria tomada pelas tropas russas em horas não se concretizou e os confrontos continuam até hoje, principalmente no leste e sul do país.   

Segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, em seis meses, 5.587 civis morreram, incluindo mais de 360 crianças e adolescentes. O número de feridos é próximo de 8 mil e deve ser maior – já que o acesso à informação não é fácil no front de batalha. Mais de 10 milhões de travessias de pessoas para países da União Europeia foram feitas desde fevereiro até agora. No mesmo período, estima-se que mais de 4 milhões de pessoas tenham feito o sentido inverso, voltando para a casa. 

A brasileira Clara Magalhães é uma das criadoras da Frente BrazUcra, que tem atuado ativamente na guerra. Antes, o principal objetivo era tirar pessoas da Ucrânia. Hoje, o trabalho se concentra em distribuir mantimentos, especialmente nas áreas com confrontos. “A gente tem uma demanda muito maior de pedidos de evacuação e de mantimentos para cidades do front. A Cruz Vermelha não vai para esses territórios. A ONU manda suprimentos, mas não tem delegações trabalhando com esses resgates. É um trabalho muito sério e perigoso que as organizações fazem hoje.”

Clara Magalhães conta que, onde os bombardeios já não são mais tão comuns, a população retomou a rotina. "A vida voltou ao normal na maioria das cidades. Eu acho que é um paralelo com o Brasil. Você acaba ficando acostumado à violência. Muitas cidades do oeste e do centro não são bombardeadas, pelo menos não com frequência. A gente fala que a maioria dos lugares é segura, até que você é bombardeado. Muita gente voltou para a Ucrânia. Eu estava em Bucha essa semana e vi crianças, o que não acontecia três meses atrás.”

Para ajudar a Frente BrazUcra, basta acessar o Instagram do grupo voluntário e seguir o passo a passo. 

Relatos da guerra

Na Ucrânia desde 2004, o padre brasileiro Lucas Perozzi usou uma paróquia em Kiev como abrigo. Agora, ele recebe refugiados do leste e do sul. O padre confirma que muita gente retornou à capital ucraniana e, aos poucos, a vida foi voltando ao normal. Até mesmo a sirene de alerta já é tratada com mais naturalidade: “pessoas que estão aqui desde o começo levam uma vida normal. A gente respeita o toque de recolher. Mas quando toca a sirene, não faz mais efeito, a gente deixa tocar, continuo trabalhando. É diferente em repartições públicas, centros comerciais ou transporte público. Eles param”. 

Desde o começo da guerra, o Ocidente apostou em sanções para tentar sufocar a economia russa e impedir o avanço das tropas de Vladimir Putin. Mas, na prática, segundo o guia de Moscou Vitaly Lezov, as medidas não impactaram o dia a dia dos russos: “ainda não chegaram os efeitos graves das sanções. A inflação não é forte ainda. No início, alguns preços subiram, mas já desceram. Não é nada dramático na vida das pessoas”.  

Vitaly também explicou à BandNews FM que não é possível dizer que a população russa foi majoritariamente favorável ou contrária à guerra. Existem muitas opiniões distintas e não é fácil medir a divergência com pesquisas: “a sociedade, há muito tempo, já entrou em uma espiral do silêncio. Nos estudos da opinião pública, essa informação não é muito válida. A gente prefere não falar, porque há censura. Não se pode dar uma resposta clara de que uma porcentagem é a favor e outra contra, não é tão fácil”. 

O avanço sobre a Ucrânia tem sido mais lento do que se esperava. O cientista político Vicente Ferraro, pesquisador do Laboratório de Estudos da Ásia da USP, explica que Vladimir Putin esperava que o leste ucraniano, que tem grupos étnicos russos, aceitaria a invasão mais passivamente - o que não aconteceu.  Além disso, a ajuda militar do Ocidente freia as tropas do Kremlin.  

Vicente Ferraro avalia que, neste momento, o fim da guerra não é interessante para nenhum dos lados: “para a Ucrânia, uma pacificação agora seria dar mais chances para a Rússia reforçar o controle sobre as regiões ocupadas, então há uma preocupação de que Moscou faça uma anexação. E do lado da Rússia, uma pacificação seria a oportunidade para a Ucrânia receber mais armamentos do Ocidente e fazer um contra-ataque". 

Kiev proibiu celebrações públicas nesta semana para comemorar a independência ucraniana, declarada em 24 de agosto de 1991.