A recente tragédia provocada pelas chuvas no Rio Grande do Sul deixou profundas marcas na saúde mental da população. O impacto emocional e psicológico atinge tanto as vítimas diretas quanto a comunidade em geral, que ainda se recupera do choque inicial.
O Melhor da Noite conversou com a psicóloga Anne Crunfl, especialista em transtorno de ansiedade, que detalhou um pouco do estresse e dos traumas que a população gaúcha pode estar enfrentando enquanto tentam se reerguer.
"O estresse e os traumas que as pessoas do Rio Grande do Sul podem experienciar nesse momento são muito amplas. Primeiro, a gente tem que entender que eles estão passando por um momento de extrema vulnerabilidade e essa vulnerabilidade traz reações pós-traumáticas comuns. Por exemplo: medo intenso de chuva, de garoa, de relâmpago. Com isso, elas podem ter compulsões de choro, uma construção cognitiva um pouco confusa, pensamentos muito confusos, perda de memória, muita dificuldade em manter o foco e muita dificuldade também de conseguir construir um pensamento lógico", explicou.
Anne disse que, neste momento, os voluntários também podem ser essenciais no apoio emocional. "As pessoas que estão ali como voluntárias podem tentar separar esse apoio em duas frentes: o primeiro é a frente prática, que seria informar sobre pontos de coleta, abrigos, água, higiene, comida, e o segundo é o cuidado emocional, cognitivo e psicológico. Neste segundo caso, toda vez que falar alguma informação para a pessoa, peça para ela repetir para ver se ela realmente entendeu."
"Não pergunte para a pessoa pelo que ela passou. Eu sei que muitas vezes a gente tende a falar determinadas frases, como: "vai dar tudo certo", "isso vai passar", "você tem que ser forte"... Tudo isso faz com que a pessoa sinta invalidada na sua dor", continuou.
A psicóloga explicou que os transtornos que podem vir a ocorrer após uma tragédia como essa são diversos, porém normais diante do trauma. "Se a pessoa tiver tendo muita ansiedade, se a pessoa estiver com humor depressivo, se a pessoa estiver tendo flashbacks, ou seja, invasão de imagens muito vívidas... Isso tudo é normal. Agora, num período de um mês um mês e meio, se ela continua tendo todos esses sintomas, aí ajuda profissional começa a ser fundamental. Às vezes, várias pessoas passam pelas mesmas coisas, mas se a pessoa tem uma estrutura emocional e psicológica organizada, esse tempo é mais curto. Se ela não tem isso organizado, ou se ela tem uma psicopatologia prévia, pode ser muito mais demorado."
Por isso, a especialista aconselha: "Por favor, não invada o momento em que a pessoa se encontra. Não a force a falar, não a force a sorrir, não compartilhe vídeos de pessoas mortas da calamidade, daquela dor tão intensa que os outros estão experienciando. Isso pode atrapalhar muito e ser um divisor de águas entre não desenvolver e desenvolver o trauma porque a dor dela será reforçada e isso é muito prejudicial."