O grupo fundamentalista islâmico Hamas libertou nesta quinta-feira (30/11) mais 8 reféns como parte do acordo de cessar-fogo temporário que entrou em seu sétimo dia.
As primeiras a serem entregues à Cruz Vermelha foram duas mulheres, de 21 e 40 anos. A elas seguiram-se, no final da noite, outras seis pessoas.
Segundo um porta-voz do governo do Catar, que media as negociações entre Hamas e Israel, os oito reféns seriam contabilizados junto às duas mulheres com dupla cidadania russa e isralenses soltas na noite anterior para atingir a cota de 10 prevista no acordo.
Em contrapartida, Israel deve liberar 30 presos palestinos, sendo 23 menores de idade e sete mulheres adultas.
Na quarta, outros dez cidadãos israelenses, sendo cinco adolescentes e cinco mulheres adultas, foram libertados no final da noite junto com mais quatro tailandeses que também estavam sob poder do grupo terrorista.
Como nas outras vezes, os reféns do Hamas foram entregues à Cruz Vermelha Internacional, que os transportou para o Egito.
Com isso, a contagem de reféns libertados ao longo desses sete dias de trégua passou a 81 israelenses, 23 tailandeses e um filipino. Se contabilizados os outros quatro reféns soltos anteriormente pelo Hamas e a soldada resgatada por Israel em Gaza, o saldo total é de 110 pessoas.
As Forças de Defesa de Israel creem que o Hamas ainda detenha 137 pessoas, entre civis e soldados, dos quais 117 são homens - acredita-se que entre eles esteja um brasileiro.
Com a intermediação de Catar, Egito e Estados Unidos, o Hamas e Israel começaram na sexta-feira uma trégua de quatro dias nos combates que vem sendo estendida desde então em negociações de último minutoante a promessa israelense de retomar sua campanha militar em Gaza caso o Hamas deixe de liberar reféns.
Além da troca de reféns e prisioneiros, a pausa serve para enviar ajuda humanitária a Gaza, inclusive para o norte do território, onde acontecem os combates mais intensos.
Dentre os libertos até agora, vários têm dupla-cidadania, como alemã, francesa, argentina, americana e russa. Israel, por sua vez, libertou até terça 210 prisioneiros palestinos, todos mulheres e menores de idade.
Extensão do cessar-fogo
Catar, Egito e EUA seguem negociando para que a trégua nos combates seja prorrogada mais uma vez. No acordo inicial, uma cláusula tornava possível a extensão do cessar-fogo por até dez dias se o Hamas mantivesse a promessa de liberar reféns diariamente.
Na quarta, o grupo radical anunciou que estaria disposto a manter o cessar-fogo, mas as negociações têm se tornado mais difíceis.
O grupo reivindicou a autoria de um atentado em Jerusalém na quinta-feira que deixou três mortos.
Israel declarou guerra ao Hamas após um ataque do grupo fundamentalista islâmico em 7 de outubro que envolveu o disparo de mais de 4 mil foguetes e a infiltração de cerca de 3 mil combatentes que mataram cerca de 1,2 mil pessoas e sequestraram mais de 240 em comunidades próximas da Faixa de Gaza, de acordo com números do governo israelense.
Em resposta, as forças israelenses atacaram o enclave palestino, onde mais de 13 mil pessoas foram mortas, segundo autoridades locais controladas pelo Hamas, e estima-se que cerca de 7 mil pessoas estejam desaparecidas sob escombros.
Bebê de 10 meses entre os reféns
Entre os reféns do Hamas na Faixa de Gaza estaria um bebê israelense de 10 meses, sequestrado junto com o irmão e os pais. Em vão, os familiares da criança apelaram no início da semana para que ele fosse liberto.
Ofri Bibas, tio do bebê, queixou-se que "todas as outras crianças já foram libertas" e que o seu sobrinho, que tinha nove meses quando foi raptado, é o refém mais jovem retido pelo Hamas.
Um porta-voz do Exército israelense, Avichai Andraee, disse que a família foi sequestrada no kibutz Nir Oz. Depois, a família teria sido transferida para outro grupo armado palestino, que a mantém cativa numa área de Khan Yunis, cidade do sul da Faixa de Gaza.
"Não sabemos onde estão detidos [os membros da família]. Estão sendo mantidos no subterrâneo. Não há muita comida para bebês e, por tudo isso, estamos muito preocupados", alegou Ofri Bibas.
As brigadas Al-Qassam, braço armado do Hamas, disseram nesta quarta-feira que o bebê, o irmão de quatro anos e a mãe foram mortos durante bombardeio israelense na Faixa de Gaza. O exército israelense informou que tentava verificar a alegação. A DW não pôde verificar o fato de forma independente.
Fuga para o Sul
A ONU vem alertando nos últimos dias para a situação gravíssima na Faixa de Gaza. A Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina (UNRWA) anunciou o envio de ajuda humanitária aos civis que ainda permanecem em Jabalia, no norte do território, em condições dramáticas.
Um comboio de seis caminhões com ajuda "muito necessária" chegou na segunda-feira aos abrigos da UNRWA em Jabalia.
"A zona estava sem assistência há quase 50 dias", declarou o diretor da UNRWA em Gaza, Thomas White, que afirmou que o impacto dos ataques aéreos "complica a distribuição da ajuda".
"Uma confusão de escombros, metal retorcido e chapas de ferro espalhadas por todo o lado. Quando passamos de carro pela cidade de Gaza, parecia uma cidade-fantasma, todas as ruas estavam desertas. As estradas estão cheias de crateras", disse Thomas White em comunicado.
Segundo ele, mais de 70% da população de Gaza foi deslocada pela guerra e mais de um milhão de pessoas estão atualmente em abrigos da UNRWA, sendo 100 mil delas em abrigos no norte.
O cessar-fogo também é uma oportunidade de pessoas do norte do enclave palestino para se deslocarem para sul, no meio de condições meteorológicas difíceis.
"Devido às fortes chuvas, vimos pessoas cobertas de lama, carregando o que podiam. Uma jovem mãe caminhava ao longo da sarjeta com as suas duas filhas pequenas, ambas chorando. Uma das meninas segurava um dos seus sapatos enlameados. Vimos homens jovens, mulheres, crianças, idosos. Algumas pessoas empurradas em cadeiras de rodas", disse White.
Fila de três horas para ir ao banheiro
O porta-voz da Unicef, James Elder, disse que há filas de até três horas para usar um banheiro ou conseguir gás para cozinhar no sul da Faixa de Gaza, para onde se deslocou quase toda a população do enclave palestino.
"Vi filas de mais de um quilômetro de pessoas na chuva esperando para conseguir gás de cozinha e metade delas teve que voltar para casa de mãos vazias", declarou Elder.
Em seu depoimento, ele destacou que a situação é "muito pior do que se imaginava", especialmente no sul, onde há mais de 1,8 milhão de pessoas deslocadas que quase não receberam ajuda em mais de seis semanas de hostilidades.
"É possível ver a devastação, o trauma e o estresse nos rostos atordoados das pessoas, especialmente das crianças", relatou.
Elder argumentou que um cessar-fogo permanente é "fundamental para o futuro das crianças da Faixa de Gaza que sobreviverão a essa guerra e que ficaram órfãs, traumatizadas e têm condições de vida atuais que não são adequadas para sua recuperação".
"Conversei com um menino de sete anos que havia perdido o pai, a mãe e o irmão gêmeo e perguntei à tia dele ‘por que ele fecha os olhos quando fala?' e ela disse: ‘Ele tem tanto medo de esquecer como eram seus pais e seu irmão que fecha os olhos para não perdê-los em sua mente, como aconteceu na vida real'", contou.
Mortes na Cisjordânia
Durante a trégua em Gaza, dois adolescentes palestinos foram mortos na terça-feira durante confrontos com o exército israelense na Cisjordânia, indicou o Ministério da Saúde da Autoridade Nacional Palestina (ANP).
Um adolescente de 14 anos foi morto em Tubas, norte da Cisjordânia, e um segundo, de 17 anos, perto de Ramallah, onde se situa a sede da ANP.
Testemunhas citadas pela agência de notícias AFP indicaram que em Tubas diversos jovens lançaram pedras em direção aos veículos militares israelenses, e os soldados responderam com armas de fogo. O exército israelense disse que a incursão se destinava a "prender dois suspeitos procurados".
"Homens armados dispararam contra as forças de segurança, que responderam com balas reais", segundo a versão dos militares, citada pelas agências internacionais.
Perto de Ramallah, o exército israelense entrou numa localidade para proceder a buscas, originando protestos da população local, com testemunhas afirmando que o adolescente de 17 anos foi atingido por quatro balas.
Na noite de segunda para terça-feira, outro jovem palestino já tinha sido morto em Beitunia, onde desde sexta-feira centenas de pessoas se concentram todas as noites para receber os prisioneiros palestinos libertos.
Também diariamente, e na mesma zona, o exército israelense tem disparado granadas de gás lacrimogêneo e utilizado armas de fogo para dispersar as pessoas.
Desde 7 de outubro, quando teve início o atual conflito, mais de 230 palestinos já foram mortos na Cisjordânia por colonos e soldados israelenses, segundo o Ministério da Saúde da Autoridade Palestina.
le/bl/ra (Lusa, EFE, AP, Reuters, ots)