A Comissão Europeia, a Alemanha e a Áustria anunciaram nesta segunda-feira (09/10) que vão suspender o envio de ajuda financeira para projetos de desenvolvimento em territórios palestinos. A decisão é anunciada dois dias após o grupo fundamentalista palestino Hamas, classificado como terrorista pela União Europeia (UE), ter realizado uma ousada e sangrenta ofensiva-surpresa contra Israel, que resultou no massacre de centenas de civis.
No caso da Comissão Europeia, o braço executivo da UE, o congelamento afeta imediatamente um portfólio de ajuda no valor de 691 milhões de euros (R$ 3,7 bilhões). "A escala de terror e brutalidade contra Israel e seu povo é um ponto de inflexão", comentou o comissário da União Europeia para Ampliação e Política de Vizinhança, Oliver Varhelyi, na rede social X (ex-Twitter).
"Não pode haver 'business as usual'", acrescentou. "As bases para a paz, a tolerância e a coexistência devem ser abordadas agora. A incitação ao ódio, à violência e a glorificação do terror envenenaram as mentes de muita gente. Precisamos de ação e precisamos dela agora."
A UE é um dos maiores fornecedores de ajuda financeira aos territórios palestinos. Entre 2021 e 2024, o bloco planejava alocar um total de cerca de 1,2 bilhão de euros (R$ 6,5 bilhões) em investimentos para os palestinos, especialmente nas áreas de saúde e educação.
Alemanha e Áustria também suspendem repasses
Nesta segunda-feira, o Ministério da Cooperação e Desenvolvimento Econômico da Alemanha também anunciou que está congelando novos repasses para os palestinos. "Está em análise, ou seja, suspenso temporariamente”, disse uma porta-voz.
No domingo, a titular da pasta, a social-democrata Svenja Schulze, já havia anunciado que os repasses seriam reexaminados, mas o governo alemão também vinha sendo pressionado por aliados e pela oposição a congelar a ajuda por completo até segunda ordem.
Em 2020, a Alemanha transferiu 193 milhões de euros (R$ 1 bilhão) para gastos em ajuda humanitária e desenvolvimento econômico para áreas palestinas. Em 2023, os compromissos assumidos pela Alemanha com os palestinos somavam 250 milhões de euros.
Segundo Schulze, a Alemanha sempre tomou cuidado para assegurar que os valores não fossem desviados para outros fins e que o dinheiro fosse gasto apenas para fins pacíficos, "mas esses ataques a Israel marcam uma terrível ruptura". Ainda segundo Schulze, a Alemanha pretende discutir com Israel como os projetos de desenvolvimento na região podem vir a ser mais bem atendidos e coordenados com parceiros internacionais.
Alemanha e Áustria unidas em prol de Israel
A Alemanha tem divulgado seguidas manifestações de solidariedade a Israel desde o ataque de sábado. No dia seguinte, o chanceler federal Olaf Scholz afirmou que Israel tem o direito "de proteger seus cidadãos e perseguir os agressores". Em conversa com o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, o social-democrata teria assegurado que seu país está "firme e inabalavelmente ao lado de Israel".
"A segurança de Israel é de interesse nacional da Alemanha. Isso é especialmente verdadeiro em momentos difíceis como este. E nós agiremos de acordo", disse Scholz.
Além da Alemanha, a vizinha Áustria também anunciou suspensão de novos repasses: "Vamos suspender todos os pagamentos de ajuda ao desenvolvimento por enquanto", disse o ministro das Relações Exteriores austríaco, Alexander Schallenberg, à rádio Ö1.
A decisão deve resultar no congelamento de 19 milhões de euros em assistência. A Áustria também pretende reanalisar todos os projetos destinados a regiões palestinas por meio de consultas com União Europeia e outros parceiros internacionais "A escala do terror é tão terrível. É uma fissura tão grande que não se pode voltar ao 'negócios como sempre'", disse o ministro Schallenberg.
A Europa é uma das principais fontes de ajuda aos territórios palestinos ocupados por Israel, onde as Nações Unidas estimam que cerca de 2,1 milhões dependem de assistência humanitária, entre elas 1 milhão de crianças.
Os anúncios da UE, Alemanha e Áustria não deixam claro se o congelamento de recursos também se aplicará à ajuda humanitária. Nos seus anúncios de suspensão, a Comissão da UE, a Alemanha e a Áustria tampouco distinguiram a Faixa de Gaza, o enclave palestino dominado pelo Hamas, da Cisjordânia, bem mais populosa, administrada pela Autoridade Palestina, atualmente liderada pelo presidente Mahmoud Abbas, tido como mais moderado e cujo grupo político se opõe aos fundamentalistas islâmicos do Hamas.
Vozes dissonantes
Na Alemanha, nem todos estão de acordo com o corte de repasses. A Sociedade Teuto-Israelense (DIG), que promove a aproximação das relações entre Israel e Alemanha, limitou-se a pedir ao governo alemão que estabeleça condições claras para os pagamentos aos palestinos.
"Terrorismo e antissemitismo não podem ser financiados com impostos alemães", disse o presidente da DIG, Volker Beck. No entanto ele não defendeu a suspensão da ajuda financeira, mas sim condições e controles mais rígidos., o que "requer decisões claras do comitê de orçamento e do Parlamento para o orçamento federal de 2024".
Outros políticos alemães rechaçaram qualquer corte da ajuda fornecida aos palestinos. O deputado Gregor Gysi, importante veterano do partido de oposição A Esquerda, argumentou que o Hamas foi responsável pelo ataque, não todos os palestinos: "As organizações palestinas podem e devem ser apoiadas, mas o Hamas não pode", disse à revista Der Spiegel.
jps/av (Reuters, AFP, DW, DPA, ots)