O pouco que restava da centro-direita que sustentou a França desde 1958 acabou de se fragmentar nesta quarta-feira (12/06) com a recusa de Eric Ciotti, do partido conservador Os Republicanos (LR), em aceitar a expulsão do partido que ele mesmo presidia até então e a insistência dele na manutenção da aliança com o Reagrupamento Nacional (RN), sigla da ultradireitista Marine Le Pen.
A aliança havia sido anunciada por Ciotti no dia anterior, após a vitória do RN nas eleições europeias e a subsequente convocação de um novo pleito para a Assembleia Nacional pelo presidente francês Emmanuel Macron.
"Nós dizemos as mesmas coisas, então vamos parar de inventar uma oposição imaginária", afirmou Ciotti na terça à emissora de TV TF1. "Isso é o que a grande maioria de nossos eleitores quer. Eles estão nos dizendo: 'façam um acordo.'"
A movimentação escandalizou correligionários de Ciotti e surpreendeu observadores políticos ao quebrar com o que, até então, era considerado um tabu no país.
Em reação, a secretária geral do LR, Annie Genevard, anunciou a expulsão de Ciotti. Ela assumiu a presidência da sigla interinamente ao lado do eurodeputado François-Xavier Bellamy.
"Ele realizou negociações secretas sem consultar nossa família política e ativistas. Quebrou, portanto, com os estatutos e a linha do LR", disse Genevard, acrescentando que o partido seguiria um caminho independente, com seus próprios candidatos nas eleições ao Parlamento francês, em vez de embarcar em uma aliança incerta com nacionalistas da ultradireita.
Ciotti, porém, rebateu que a decisão da executiva do partido era inválida e que fora realizada em violação flagrante dos estatutos do partido.
"Nenhuma das decisões tomadas nessa reunião tem consequências legais. Eu sou e continuo sendo presidente eleito do nosso partido", escreveu Ciotti no X (antigo Twitter).
Sabotagem
Antes da reunião que determinou a expulsão dele, Ciotti orientou funcionários que estavam na sede do partido a saírem e fecharem o imóvel, de modo a sabotar o encontro. Com isso, os membros da executiva tiveram que caminhar por 500 metros até um local improvisado para deliberar sobre o caso.
O LR tem atualmente 62 de 577 deputados, controla o Senado e também um bom número de prefeituras. Ainda não se sabe, contudo, quem serão os candidatos do partido à Assembleia Nacional, nem quantos dos atuais deputados estão dispostos a se aliarem à ultradireita para manter seus mandatos.
Macron: "Estão dando as costas à herança conservadora da França"
Ao comentar a aliança de Ciotti com a ultradireita, Macron disse que membros do LR estavam dando as costas para a herança conservadora da França, incluindo ícones como Charles de Gaulle, Jacques Chirac e Nicolas Sarkozy.
"Estamos vendo as máscaras caírem desde a noite de domingo", afirmou, aludindo às movimentações dos partidos à direita e à esquerda desde que anunciou novas eleições legislativas. "Diria que esse é um julgamento da verdade entre os que querem que seus próprios interesses floresçam e os que querem que a França floresça."
Em reação ao fiasco nas eleições europeias, Macron dissolveu o Parlamento e convocou novas eleições para a Assembleia Nacional, desencadeando uma corrida por alianças entre os partidos.
As movimentações ocorrem até mesmo na ultradireita: sobrinha de Le Pen, a eurodeputada Marion Marechal vai deixar seu partido, o anti-islã Reconquista, para se juntar à tia. A sigla teve 7% dos votos nas eleições presidenciais de 2022 e 5,5% dos votos na eleição europeia.
Na esquerda, as duas principais forças, a França Insubmissa (LFI) e o Partido Socialista (PS) disseram ter chegado a um acordo que incluirá verdes e comunistas.
A decisão de Macron de convocar eleições antecipadas – a serem realizadas em 30 de junho e 7 de julho – é considerada uma tacada arriscada. Se perder, Macron terá que governar até o fim de seu mandato, em 2027, ao lado de um primeiro-ministro de oposição – na semi-presidencialista França, o presidente depende de um primeiro-ministro apontado pelo Parlamento para assegurar a governabilidade.
ra (EFE, dpa, ots)