Por estes dias, a diplomacia brasileira terá muito o que fazer: no prazo de um mês, transcorrem diversos encontros importantes, nos quais o país terá que definir sua posição futura na política mundial.
Os eventos são de alto gabarito, a começar pela recente cúpula do Brics+ na Rússia, a primeira desde a ampliação da aliança internacional. O fórum da Cooperação Econômica Ásia-Pacífico (Apec), no Peru (de 10 a 16 de novembro), é importante para a integração do Brasil na América do Sul e no mercado asiático. O país ainda é o anfitrião da cúpula do G20 no Rio de Janeiro (em 18 e 19 de novembro); e, imediatamente após, o chefe de Estado da China, Xi Jinping, estará de visita, por ocasião do 50º aniversário das relações sino-brasileiras.
Parte-se do princípio que nessas ocasiões o Brasil procurará demonstrar uma posição neutra do ponto de vista geopolítico, comparável ao papel de um país não alinhado a um bloco. Perante o agravamento dos confrontos mundiais, a empreitada será difícil, e decepcionará muitos que esperam do governo de Luiz Inácio Lula da Silva um posicionamento político claro no âmbito internacional.
Assim, ao tomar o partido da Rússia, Venezuela e dos palestinos, ele perdeu simpatias nos Estados Unidos e na União Europeia. O "plano de paz" para a Ucrânia apresentado conjuntamente por Brasília e Pequim, que acima de tudo leva em consideração os interesses russos, reforçou as dúvidas do Ocidente democrático.
Ao mesmo tempo, porém, o Brasil tem resistido às tentativas da China de abraçá-lo. Esta pressiona pela assinatura de um acordo para a Nova Rota da Seda, a fim de facilitar o acesso de investidores chineses; enquanto Brasília deseja acesso à tecnologia e compromissos de investimento confiáveis – que até agora Pequim nem ofereceu, nem quer garantir.
Além disso, o país está negociando com a potência asiática a partir de uma posição de força: apesar de ser a maior parceira comercial do Brasil, justamente devido a sua confrontação com os EUA, a China depende de importar alimentos e petróleo brasileiro.
Até que ponto o Brasil conseguirá se manter "neutro" no futuro, não é algo que se decida só em Brasília, mas também junto com os desdobramentos políticos, por exemplo das eleições presidenciais americanas ou do decorrer da crise econômica chinesa.
Governo Lula quer ser realmente neutro?
A neutralidade brasileira poderá se tornar importante se o cabo-de-guerra entre novas e antigas potências se acirrar: o país quer e deve continuar realizando negócios e mantendo o diálogo com todo o mundo. E, apesar de, nos últimos dez anos, ter perdido relevância na economia mundial, ele ganhará peso como exportador.
Enquanto produtora e fornecedora global de alimentos, matérias-primas industriais, e energia convencional e sustentável, a economia brasileira deve recuperar importância – certamente como exportadora, possivelmente também como locação para empresas estrangeiras à busca de sítios neutros para seus investimentos em todo o mundo.
Entretanto existe o risco de que o governo Lula não deseje realmente permanecer neutro. Quem viu a ex-presidente Dilma Rousseff brincando animadamente com Vladimir Putin na cúpula russa do Brics+, pode se perguntar se, no fim das contas, Brasília não se sente muito melhor na ala "anti-imperialista" do que no Ocidente democrático.
Precisamente devido a esse posicionamento antiocidental, Dilma está no seu elemento, como presidente do Novo Banco de Desenvolvimento, conhecido como Banco do Brics. Isso ficou confirmado quando, recentemente, ela recebeu a mais alta distinção da China. Tais gestos da ex-mandatária não transpiram neutralidade.
Nas próximas semanas, o governo brasileiro e sua diplomacia têm que mostrar de que lado estão, politicamente. Perante tal quadro, torna-se ainda mais importante uma conclusão do acordo de livre-comércio Mercosul-União Europeia, pois ambos os lados sairiam ganhando: com a criação da maior comunidade econômica do mundo, elevariam sensivelmente seu peso geopolítico.
Isso é no interesse tanto da América do Sul quanto da Europa, já que nos últimos tempos essas duas regiões perderam significado geopolítico. Juntas poderão ter mais força.
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Há mais de 30 anos o jornalista Alexander Busch é correspondente de América do Sul. Ele trabalha para o Handelsblatt e o jornal Neue Zürcher Zeitung. Nascido em 1963, cresceu na Venezuela e estudou economia e política em Colônia e em Buenos Aires. Busch vive e trabalha em Salvador. É autor de vários livros sobre o Brasil.
O texto reflete a opinião pessoal do autor, não necessariamente da DW.
Autor: Alexander Busch