Como a Coreia do Norte vem perdendo influência na África

Especialistas dizem que muitas nações do Sul Global consideram mais arriscado ter Pyongyang como parceiro diplomático. País também começou a concentrar suas relações diplomáticas na Rússia.

Por Deutsche Welle

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No final de outubro, os embaixadores da Coreia do Norte em Angola e em Uganda despediram-se dos líderes locais, com os meios de comunicação sul-coreanos especulando que mais embaixadas norte-coreanas na África poderiam ser forçadas a fechar nos próximos meses devido às dificuldades financeiras de Pyongyang.

"É claro que eles estão tendo problemas financeiros, e a sua posição internacional está se tornando cada vez mais isolada, mas também pode ser que Pyongyang já não tenha realmente um interesse direto em alguns destes países", diz Lim Eun-jung, professora de estudos internacionais na Universidade Nacional de Kongju, na Coreia do Sul.

"Apesar das sanções, a Coreia do Norte não está completamente falida, e é provável que queira concentrar seus recursos financeiros nas suas capacidades nucleares e de mísseis de longo alcance, assim como no satélite de vigilância que prometeram lançar num futuro próximo", afirma ela à DW.

?Papel encolhe na África

Lim acrescenta que a Coreia do Norte não está recebendo uma recepção tão calorosa em muitos países africanos como costumava receber.

Angola, por exemplo, aceitou cerca de 3 mil "conselheiros” militares nas décadas de 1970 e 1980. Estas tropas foram encarregadas de treinar tropas locais, mas também lutaram contra as forças sul-africanas.

Mas o governo angolano começou a se distanciar da Coreia do Norte em 2019, quando, sob pressão da ONU, deportou quase 300 norte-coreanos.

As tropas norte-coreanas também treinaram militares ugandenses, inclusive em artes marciais, e houve sugestões de que armas leves norte-coreanas foram importadas para o país.

Pyongyang cultivou laços estreitos com a Etiópia e o Quênia e foi um aliado de longa data do Zimbábue, que ainda em 2013 assinou um acordo para exportar bolo amarelo (material composto de urânio) das suas minas em Kanyemba para a Coreia do Norte. Pyongyang pagou pelo combustível nuclear com armas.

"Resta saber se a pressão internacional sobre estes governos será suficiente para encorajá-los a distanciarem-se agora", diz Lim.

Aproximação com a Rússia

"Muitos países do Sul Global veem agora um risco maior em ter laços estreitos com a Coreia do Norte e já não a veem como um parceiro diplomático desejável", ressalta a especialista. "O comportamento da Coreia do Norte tem sido muitas vezes ultrajante para a comunidade internacional, e eles não irão mais tolerar isso."

No entanto, a Coreia do Norte agiu rapidamente para compensar essa situação, segundo Lim.

"O país se aproximou muito mais de Moscou para a sua própria sobrevivência, o que não é algo inesperado”, acrescenta.

"Imediatamente depois de a Rússia ter invadido a Ucrânia no ano passado, a Coreia do Norte declarou apoio e agora está fornecendo munições e outras armas para a guerra. Em troca, está recebendo combustível e alimentos, ambas coisas de que necessita desesperadamente, mas que não pode obter dos países africanos."

Toshimitsu Shigemura, professor da Universidade Waseda de Tóquio e especialista na liderança norte-coreana, concorda que o elevado custo da operação de missões diplomáticas no estrangeiro deve ter sido um fator importante por detrás da decisão de Pyongyang de encerrar algumas delas, mas há outras considerações.

"As embaixadas da Coreia do Norte não recebem nenhum dinheiro de Pyongyang e são forçadas a ganhar os seus próprios rendimentos", diz ele.

Ele acrescenta que a maneira mais fácil de fazer isso é muitas vezes ilegal, com diplomatas norte-coreanos tendo sido implicados no passado no contrabando de cigarros falsificados, moeda, narcóticos sintéticos, armas e até chifres de rinoceronte, muitas vezes através da bolsa diplomática.

"No entanto, muitos países tomaram conhecimento dos subterfúgios de Pyongyang e tornaram muito mais difícil para os diplomatas o contrabando", lembra Shigemura.

O jornal japonês Yomiuri também noticiou que a Coreia do Norte fechará o consulado que abriu em Hong Kong em 1999, dois anos depois de a antiga colônia britânica ter sido devolvida ao controle chinês.

O consulado tem sido amplamente visto como uma das estações externas mais importantes da Coreia do Norte e, ignorado pelas autoridades chinesas, esteve envolvido nos esforços para contornar as sanções, organizando remessas ilícitas de combustível e outros produtos proibidos que poderiam ser transferidos no mar para navios norte-coreanos.

?Fuga de diplomatas

"Também acredito que a Coreia do Norte esteja preocupada com a fuga de mais diplomatas, o que tem sido uma grande fonte de constrangimento no passado”, ressalta Shigemura.

Thae Yong-ho, antigo vice-embaixador em Londres, desertou com a sua família em 2016 e desde então foi eleito para o Parlamento sul-coreano, onde é um crítico veemente de Pyongyang.

Da mesma forma, o antigo embaixador norte-coreano na Itália, Jo Song-gil, desapareceu com a sua esposa em 2020 e agora vive na Coreia do Sul, enquanto no ano seguinte Ryu Hyun-woo, o antigo enviado interino ao Kuwait, também desertou.

"Muitos destes diplomatas gostavam de viver no estrangeiro e não queriam regressar à Coreia do Norte, por isso desertaram", afirma Shigemura.

"Para os líderes de Pyongyang, isso é traição, mas também é humilhante."

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