Corpos de crianças Yanomami são devolvidos para rituais funerários tradicionais

Três dos quatro corpos de vítimas da Covid-19 que foram sepultados em Boa Vista (RR) foram exumados e levados para as comunidades

Da redação

Corpos de crianças Yanomami são devolvidos para rituais funerários tradicionais
Corpos de crianças Yanomami são devolvidos para rituais funerários tradicionais
Reprodução

Três dos quatro corpos de indígenas Yanomami vítimas da covid-19 que haviam sido sepultados em Boa Vista (RR) foram exumados e devolvidos a suas comunidades, de forma a dar sequência aos rituais funerários tradicionais.

A devolução foi dificultada após medidas preventivas adotadas pela Defesa Civil de Roraima, sob o argumento de que a transferência de restos mortais representariam risco, no início da pandemia.

Dos quatro indígenas que tiveram os restos mortais enterrados fora do território Yanomami, três eram de crianças – uma delas, recém-nascida. O outro era de um adolescente de 15 anos.

O caso ganhou repercussão porque, segundo a tradição da comunidade, a manutenção de restos mortais em cemitério viola o direito fundamental de luto dos povos indígenas. Para os Yanomami, “a não realização dos rituais pode causar malefícios tanto para o morto no mundo espiritual, quanto para a comunidade no mundo físico”, informou o Ministério Público Federal, órgão responsável pelo pedido de devolução desses restos mortais.

“A proteção constitucional conferida aos indígenas inclui a realização de rituais funerários, sendo certo que ignorar as práticas culturais em momento tão grave para uma família e uma comunidade é agravar a situação de sofrimento e a violência sofrida em razão de doenças levadas por não indígenas”, argumentou o procurador da República Alisson Marugal na ação.

A primeira das quatro vítimas fatais foi o adolescente. Em nota, o MPF informou que o corpo dele foi exumado na quarta-feira (22) mas que, devido a regras sanitárias, o envio à comunidade ainda não tem data definida.

Já os corpos das três crianças foram devolvidos na quinta-feira (23) aos familiares e lideranças, para darem início aos rituais fúnebres.

Segurança sanitária

Os detalhes do caso foram explicados na nota publicada pelo MPF.

“As crianças faleceram após complicações graves de covid-19 nos primeiros meses da pandemia, em 2020, quando ainda havia incertezas sobre a segurança sanitária da remoção de restos mortais. Diante desse quadro, a Defesa Civil de Roraima elaborou, na época, norma proibindo a população indígena de realizar seus rituais fúnebres, prevendo tão somente a exumação dos corpos após o fim da pandemia”.

O MPF acompanhou as negociações, na busca por subsídios para a proposta que estava sendo elaborada com o intuito de recomendar o retorno dos corpos sepultados.

Em dezembro de 2021, tendo às mãos pareceres do Instituto Médico Legal (IML) de Roraima e da Vigilância Sanitária de Boa Vista, o órgão emitiu recomendação para que fossem feitas a exumação e a transferência dos restos mortais “de indígenas enterrados sem autorização das comunidades”.

“No entanto, a Secretaria de Saúde Indígena (Sesai) se recusou a cumprir a recomendação, alegando risco epidemiológico para as comunidades. Em razão da negativa, o MPF ajuizou ação civil pública para obrigar a União e o governo de Roraima a promoverem a exumação e o traslado dos corpos dos indígenas”, detalhou o MPF.

Em fevereiro de 2023, a Justiça fixou prazo de dez dias, sob pena de multa, para que a União demonstrasse o cumprimento da determinação judicial.

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