O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou orgulhosamente há pouco que o desmatamento na Amazônia caiu 22% em um ano. Eu estava em Manaus quando os números foram divulgados. Quase todas as pessoas que encontrei reagiram com surpresa às boas notícias de Brasília.
Manaus sofre atualmente uma combinação dramática de seca histórica com incêndios descontrolados na região.
Em outubro e até poucos dias atrás, a cidade esteve repetidas vezes coberta por uma grossa fumaça. O Rio Negro, a mais importante linha vital de comunicação da cidade isolada, está com o nível de água mais baixo em 120 anos.
Os navios de transporte de contêineres, dos quais a Zona Franca depende para importar peças e enviar produtos finalizados, não conseguem mais atracar. Muitos trabalhadores foram dispensados da zona industrial nas últimas semanas. Há somente um tráfego fluvial limitado rio acima.
Os incêndios na Amazônia em outubro foram, de fato, os maiores em mais de 25 anos.
A aparente contradição nos números oficiais do governo se explica pelo fato de o Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), comparar os dados de agosto de 2022 a 31 de julho de 2023 com o mesmo período anterior.
As áreas de floresta no centro da Amazônia que estão atualmente em chamas não apareciam quando esses dados foram coletados. Esses incêndios, porém, deverão impulsionar os índices de desmatamento que somente serão computados nos levantamentos do Prodes do próximo ano.
Centro da floresta em chamas
O que ocorre atualmente no estado do Amazonas é um desdobramento novo e dramático, que é bem mais extremo do que previam os conservacionistas da floresta úmida. As mortes em massa de botos é um sinal de que algo está completamente fora de controle na Amazônia
Até agora, o Amazonas, de área três vezes do tamanho da França, vinha sendo considerado a área com uma das florestas tropicais menos destruídas na América do Sul, com 97% de sua área tida como intacta.
O desmatamento à base de queimadas das últimas décadas ocorreu principalmente nos estados ao leste e sul da floresta, como Pará e Rondônia. Agora, porém, é o centro da floresta amazônica que está em chamas – o que é algo dramático.
Em Manaus, as pessoas estão particularmente espantadas que os incêndios explosivos na região recebam pouca atenção – tanto de ativistas quanto de políticos. A imprensa brasileira repercute extensivamente as consequências da fumaça em Manaus, mas não menciona de onde vem e o que isso significa para a Amazônia.
Ausência de protestos
Com as áreas desmatadas mais amplas localizadas no centro da floresta, a Amazônia perde cada vez mais a habilidade de autoirrigação. Até agora, a floresta prosperou com a elevação da umidade que forma névoas e retorna como chuva. Se essas superfícies de evaporação desaparecerem, esse ciclo será interrompido. Os "rios voadores" se tornarão mais estreitos, como ocorre agora com o Rio Negro.
Os apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro se queixam das queimadas na Amazônia nas redes sociais. O teor das críticas é que se os incêndios na floresta tivessem explodido no governo Bolsonaro da mesma forma que agora, ambientalistas no Brasil e no mundo estariam ruidosamente protestando.
De fato, pode parecer agora que esses mesmos defensores da floresta estão em silêncio ou apenas criticando a portas fechadas, sob o seguinte lema: "o presidente Lula e a ministra Marina da Silva estão no caminho certo no que diz respeito à proteção da Amazônia; não precisamos colocar o dedo na ferida."
Mas, dessa forma, o movimento ambientalista faz um desserviço à Amazônia. É urgentemente necessário apontar a natureza dramática dos acontecimentos, e não maquiá-los.
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Há mais de 30 anos, o jornalista Alexander Busch é correspondente de América do Sul. Ele trabalha para o Handelsblatt e o jornal Neue Zürcher Zeitung. Nascido em 1963, cresceu na Venezuela e estudou economia e política em Colônia e em Buenos Aires. Busch vive e trabalha em Salvador. É autor de vários livros sobre o Brasil.
Autor: Alexander Busch