Escolas da França começam a barrar alunas vestindo abayas

Governo proibiu uso de vestimenta muçulmana no ambiente escolar, invocando lei que assegura laicidade no sistema educacional. Cerca de 300 meninas foram barradas no primeiro dia de imposição da medida.

Por Deutsche Welle

Centenas de estudantes foram barradas de escolas públicas francesas nesta segunda-feira (05/09), no primeiro dia do ano letivo do calendário escolar do país, após a imposição de uma medida do governo que proíbe o uso de abayas no ambiente letivo. A abaya é uma vestimenta tradicional, normalmente usada por muçulmanas, que cobre mulheres e meninas da cabeça aos pés, deixando de fora apenas o rosto, as mãos e os pés.

O ministro da Educação da França, Gabriel Attal, informou que somente 298 jovens se apresentaram nas escolas vestindo abayas. A maioria delas aceitou remover as túnicas, embora 67 estudantes tenham se negado a fazê-lo, sendo enviadas de volta para casa.

O governo considerou que a proibição foi amplamente aceita, levando-se em conta o total de 12 milhões de alunas e alunos que iniciaram o ano letivo nesta segunda-feira. Attal afirmou que as escolas do país deram início a uma "fase de sensibilização, de pedagogia e de diálogo” sobre o uso da vestimenta.

"Graças ao empenho dos funcionários, à prioridade dada ao diálogo, a regra que estabeleci sobre abayas e qamis [a túnica masculina] foi respeitada desde esta manhã, sem grandes dificuldades para informar.

A escola acolhe todos os seus alunos. Todos. Sem exceção. De acordo com as regras republicanas", escreveu o ministro no Twitter.

Defesa da laicidade

A proibição das abayas nas escolas públicas foi anunciada no final de agosto. O governo alega que ao uso da vestimenta infringe a lei que estabelece a laicidade no sistema educacional do país, que já proibia o uso do hijab, o véu muçulmano.

Uma lei de 2004 proíbe "o uso de símbolos ou trajes com os quais os alunos possam mostrar ostensivamente uma afiliação religiosa" nas escolas. Isso inclui o uso de crucifixos, do quipá judaico e das vestes islâmicas.

As escolas do país sempre foram um campo de batalha da laicidade, a rígida cultura francesa de separação da religião e do Estado. Antigamente, os maiores conflitos envolviam a influência da Igreja Católica no ensino. Mas, nas últimas décadas, o debate passou a envolver as manifestações religiosas da crescente comunidade islâmica francesa.

Mas a abaya permaneceu por anos em uma zona cinzenta. Alguns grupos muçulmanos na França apontavam que ela não tinha conotação religiosa, sendo mais uma vestimenta típica de grupos árabes do norte da África e do Golfo Pérsico. Dessa forma, ela vinha sendo tolerada em ambientes escolares.

Mas, recentemente, um sindicato de diretores de escolas pediu que o governo emitisse diretrizes sobre como lidar com a abaya. E o governo do presidente Emmanuel Macron entendeu que a abaya é uma forma de ostentação religiosa que não deve ter espaço nas escolas.

O uso cada vez mais comum das abayas nas escolas dividiu opiniões na política francesa, com os partidos de direita e ultradireita defendendo a proibição da vestimenta. Já a esquerda permaneceu dividida. Uma pesquisa divulgada em agosto mostrou que 71% dos franceses apoiam a medida.

Alguns políticos, no entanto, argumentaram que a imposição representa uma afronta às liberdades civis, e acusaram Emmanuel Macron de tentar se aproximar ideologicamente da ultradireitista Marine Le Pen, a nove meses das eleições europeias.

O ambiente escolar francês permanece especialmente tenso desde 2020, quando um professor foi decapitado por um fanático muçulmano após exibir caricaturas do profeta Maomé em uma aula sobre liberdade de expressão.

Ação na Justiça

O Conselho Constitucional, a mais alta instância jurídica da França, começará a julgar nesta terça-feira uma ação impetrada pela entidade Ação de Direitos dos Muçulmanos (ADM) que pede a suspensão da proibição.

A ADM afirma que a norma estigmatiza pessoas de religião muçulmana e "representa uma ameaça a seus direitos fundamentais no plano social". O Conselho terá prazo mínimo de 48 horas e limite máximo de um mês para julgar a petição.

O próprio Macron saiu em defesa da proibição nesta segunda-feira, afirmado que somente uma minoria insiste em desafiar o laicismo que caracteriza a sociedade francesa.

rc/jps (AFP, EFE, ots)

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