Torturas, assassinatos, saques - a terrível lista de denúncias contra o Grupo Wagner é extensa. Nos últimos anos, os mercenários têm sido acusados de vários crimes de guerra em diversas áreas de conflito onde atuavam. Eles eram comandados pelo oligarca russo Yevgeny Prigozhin que morreu após a queda de um avião em agosto. O exército privado lidera a atuação paramilitar da Rússia em regiões onde o país trava conflitos armados.
Na Líbia, por exemplo, o grupo militar teria espalhado minas terrestres, explosivos que são proibidos pelo direito internacional. No Mali e na República Centro-Africana, há suspeitas de que os mercenários promoveram execuções. Os integrantes do Wagner teriam ainda torturado e assassinado civis ucranianos.
"As operações do grupo na Ucrânia, Oriente Médio e África são uma ameaça à segurança mundial", disse a secretária do Interior do Reino Unido, Suella Braverman. "Eles são terroristas, simples assim", acrescentou.
Por isso, Braverman quer que o grupo classificado como organização terrorista. O ministério do Interior apresentou um projeto de lei ao Parlamento britânico sobre o assunto. O primeiro-ministro Rishi Sunak parabenizou a iniciativa em uma postagem no X, o antigo Twitter.
O que caracteriza uma organização terrorista?
A proposta de Braverman está baseada na lei sobre antiterrorismo do Reino Unido, que define como terrorismo "a ameaça ou uso de meios violentos para influenciar governos ou intimidar a população em favor de objetivos políticos, religiosos ou ideológicos".
Outros países e organizações internacionais aplicaram definições parecidas, mas os conceitos de "terrorismo" e "organização terrorista" são variáveis. Apesar de inúmeras tentativas, não há uma definição global única para esses termos.
De acordo com a lei alemã, por exemplo, terrorismo é uma luta duradoura com fins políticos que devem ser impostos com ajuda de ataques à vida, à integridade física e à propriedade. No entanto, ao contrário do Reino Unido, a Alemanha não tem a pretensão de classificar organizações como terrorista de maneira isolada, mas sim em conjunto com a União Europeia.
Quais são as consequências dessa classificação?
No Reino Unido, a classificação de uma organização como terrorista torna ilegal qualquer tipo de apoio ao grupo militar privado. Correligionários que, por exemplo, organizem reuniões para os membros do Wagner, providenciem suporte financeiro ou logístico, ou que divulguem os símbolos do grupo publicamente estão sujeitos a multas e penas de mais de 14 anos de prisão.
O Estado pode ainda confiscar as propriedades que pertencem ao Grupo Wagner. O Reino Unido, assim como outros países e organizações internacionais, já aplicaram sanções à empresa paramilitar e a Prigozhin, incluindo o congelamento de ativos financeiros. No futuro, integrantes e apoiadores do Grupo Wagner poderiam ter mais dificuldades para adquirir fundos no país, pois essa atividade poderia motivar processos criminais.
A classificação como terrorista cria uma base legal para que as vítimas do Grupo Wagner possam processá-lo em tribunais no Reino Unido, ainda que os crimes não tenham sido cometidos em solo britânico.
Banimento em outros países
Mesmo antes de a Rússia lançar a ofensiva em larga escala contra a Ucrânia, o Grupo Wagner já estava no radar de organizações internacionais de direitos humanos por supostos crimes de guerra em áreas do Oriente Médio e da África. Em 2020, os Estados Unidos e a União Europeia aplicaram sanções contra Prigozhin e seu exército particular por lutarem ao lado do general Haftar na Líbia.
No início de 2023, os Estados Unidos caracterizaram o Grupo Wagner como "organização criminosa transnacional". Na esteira dessa decisão, outros governos passaram a adotar esforços semelhantes para classificar o grupo como organização terrorista.
Houve propostas no Parlamento Europeu, no Congresso Americano, na Assembleia Nacional Francesa e no Parlamento Sueco. Enquanto a UE ainda hesitava em promover um banimento em todo o bloco, a Lituânia já tinha rotulado o Grupo Wagner como uma organização terrorista. A Assembleia Parlamentar da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa também aprovou uma resolução no mesmo sentido.
Outros países vão acompanhar essa tendência?
Na Alemanha, aumenta a pressão para uma classificação desse tipo ao nível da UE. No final de maio, os conservadores da União Democrata Cristã (CDU) e União Social Cristã (CSU) enviaram uma proposta nesse sentido, mas até agora a coalizão que governa o país não encontrou uma base legal classificar o Grupo Wagner como uma organização terrorista.
O governo respondeu ao pedido da oposição dizendo que "os pré-requisitos legais para que a UE inclua organizações na lista de terroristas são elevados", conforme noticiado pelo jornal alemão Frankfurter Allgemeine Zeitung.
Classificar o Grupo Wagner como organização terrorista requer "um conjunto robusto de evidências baseadas em informações públicas". Caso contrário, esses dados não poderiam ser usados em processos judiciais, e o movimento pela classificação do grupo como terrorista seria inócuo, sem consequências legais.
Nos Estados Unidos, a discussão sobre uma possível classificação do Grupo Wagner está em pleno vapor. Argumentos a favor e contra essa decisão são considerados no debate. Entretanto, a questão não é apenas legal, mas também política. Equiparar o Grupo Wagner a outras organizações como o Boko Haram, o Estado Islâmico ou a Al-Qaeda poderia passar uma forte mensagem de condenação a suas ações.
No entanto, o presidente Joe Biden teme que esse posicionamento possa colocar em risco as relações diplomáticas dos Estados Unidos com países africanos, como Mali e República Centro-Africana, onde o Grupo Wagner opera com a autorização tácita dos governos locais.
Autor: Thomas Latschan