
Há 40 anos, acontecia a última eleição indireta para presidente da República no Brasil. No dia, a votação no colégio eleitoral, vencida por Tancredo Neves, abriu o período da retomada da democracia brasileira.
Nove meses separam duas datas fundamentais no renascimento da democracia no Brasil: em 25 de abril de 1984, faltaram 22 votos para a Câmara dos Deputados aprovar a emenda Dante de Oliveira, que garantia a volta das eleições para presidente da República.
Em 15 de janeiro de 1985, no colégio eleitoral criado pelos militares para garantir a vitória dos escolhidos pela ditadura, Tancredo Neves foi eleito presidente.
O que aconteceu nestes 9 meses que decretou o fim da ditadura, que já somava 20 anos? Quem foram os personagens? Quais foram os passos, as articulações, para chegar a este momento?
O clamor pelas eleições diretas levou o povo, que se reunia em gigantes comícios, para a rua. O deputado Ulisses Guimarães era a imagem do movimento: o Sr. Diretas. Governador de Minas Gerais, Tancredo marcava presença nos palanques.
Todos os políticos sabiam que a vitória das “Diretas Já” era difícil – e Tancredo Neves era o plano B, caso a disputa fosse para o Colégio Eleitoral.
“Uma hora, o Tancredo encostou no Ulisses, em um canto, e falou assim: ‘Ulisses, você está vendo o que tem de gente aqui? Como é que nós vamos fazer para administrar esse povo depois?”, disse o jornalista Ricardo Kotscho.
Não foi preciso. O povo que descobriu a rua ajudou a embalar a campanha de Tancredo. Mesmo no colégio eleitora, nas eleições indiretas, onde a população não votaria, assim que o político mineiro foi escolhido como candidato de oposição, os comícios recomeçaram em todo Brasil.
“Nós fomos às ruas falando em ‘Diretas Já’. A emenda das diretas foi derrotada. Vamos deixar a ditadura continuar fazendo os presidentes da República? Aí o doutor Ulisses Guimarães tomou a palavra e disse que não, não em eleições indiretas. O candidato tem que ser você, Tancredo”, disse o comentarista Miro Teixeira.
O poder de articulação de Tancredo foi fundamental para a vitória. Nos gabinetes, ele venceu as barreiras militares, conquistou apoio no partido do governo de insatisfeitos com a escolha de Paulo Maluf como candidato do regime e reforçou a marca de conciliador.
Foi preciso muita habilidade política para costurar um acordo que garantisse a vitória. Mas Tancredo Neves era bem mais que um conciliador.
Tancredo foi ministro da Justiça de Getúlio Vargas e esteve ao lado do presidente nos instantes finais da crise que levou Vargas ao suicídio. No começo dos anos 60, depois da renúncia de Jânio Quadros, conseguiu articular a posse do vice, João Goulart, e impedir uma possível guerra civil.
Assim, ele se tornou primeiro-ministro de um breve parlamento e foi leal a uma das principais bandeiras de Jango às reformas de base. Em 64, enfrentou os golpistas que derrubaram a democracia em uma sessão histórica que teve o deputado Almino Afonso como testemunha.
Por tudo isso, 21 anos depois, no colégio eleitoral, não deu outra: Tancredo recebeu 480 votos. Paulo Maluf, 180.
Mas a história reserva momentos cruéis. Na véspera da posse, Tancredo passou mal, foi hospitalizado e 39 dias depois morreu com infecção generalizada. Em seguida, José Sarney tomou posse, mas a principal promessa de Tancredo, feita há 40 anos, foi cumprida.