Jornal da Band

Revoltas e até linchamento de delegado antiescravidão antecederam abolição

Delegado abolicionista que se recusou a prender escravizados fugitivos foi linchado na frente da esposa e filha, crime que contou com fazendeiros brasileiros e americanos

Por Giba Smaniotto

Foi no Paço Imperial, no Rio De Janeiro, que a princesa Isabel assinou a Lei Áurea, em 13 de maio de 1888. A medida fez o Brasil se tornar o último país da América a acabar com a escravidão. Foram quase 400 anos para o país chegar a esse momento.

Uma multidão saiu às ruas para comemorar o fim da escravidão. Aquilo significava a liberdade de mais de 700 mil escravizados. A maioria já estava livre pelas leis do “Ventre Livre" e dos "Sexagenários". Na prática, extinguiram o trabalho forçado de forma gradual. Somado a isso, várias províncias, como a do Ceará, e algumas cidades já tinham decretado a abolição.

Os escravizados que restaram se rebelavam todos os dias. Aconteciam fugas em massa e havia desobediência dos últimos cativos. Não foi isso que fez a abolição, mas foi esse o ponto que marcou o timing da libertação.

Tinha uma pressão naquele momento, uma pressão política e uma pressão não só interna, mas também externa (professor Vitor Hugo Monteiro)

De olho na sucessão

De olho num terceiro reinado, Isabel aproveitou que o pai, D. Pedro II, voltou à Europa para tratar da saúde. Na prática, por estar na linha de sucessão, a libertação dos escravizados era uma pauta popular.

“Como era uma pauta popular, na época, seria uma maneira de ela [Isabel] catapultar o reinado dela, que não veio a acontecer, porque, justamente quando ela abole a escravidão, ela também perde o apoio dos grandes senhores de escravos do Brasil”, explicou o professor Vitor Hugo.

Crime brutal contra delegado abolicionista

Era inevitável abolir a escravidão. O Brasil estava à beira de uma guerra civil. A tensão ficou bem maior, meses antes da assinatura da Lei Aurea no Rio de Janeiro. Um episódio, no interior de São Paulo, ilustra bem a situação crítica. Em Itapira, famosa pelas fazendas de café, à época, um delegado abolicionista foi assassinado. Joaquim Firmino de Araújo Cunha se negava a prender escravizados fugitivos.

Mais de 150 pessoas encurralaram o delegado, dentro de casa, na frente da mulher e da filha. Joaquim Firmino foi morto a porretadas, socos e chutes, em 11 de fevereiro de 1888, sábado de Carnaval.

Era preciso não apenas matar o delegado. Era preciso linchar e humilhar. Ele foi humilhado, de uma maneira muito dolorosa (escritor Eric Apolinário)

Influência de americanos escravagistas

O escritor Eric Apolinário explicou que os responsáveis pela morte de Joaquim Firmino foram fazendeiros escravagistas unidos a americanos confederados que moravam Itapira. Um dos envolvidos, o fazendeiro John Jackson Klink, assim como outros estadunidenses, veio para o Brasil para se manter por meio da escravidão.

Na época, a cidade se chamava Penha do Rio do Peixe, mas os próprios responsáveis pelo assassinato e fim de quem defendia a abolição assumiram o Executivo e o Legislativo. Com isso, mudaram o nome da cidade para Itapira. Quiseram apagar o fato brutal contra o delegado e a história vergonhosa que eles mesmos provocaram.

Marco terrível da história

D. Pedro II chegou a passar em Itapira alguns anos antes da abolição. A cidade marca um dos momentos mais terríveis da história do Brasil.

O crime ocorreu três meses antes da abolição. Um cara, que enfrentou o poder da sua época, enfrentou esses poderosos dos Estados Unidos por conta da liberdade (escritor Eric Apolinário)
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