A violência que cerca e domina o dia a dia da população soteropolitana fez o medo entrar na rotina de quem vive ou trabalha em bairros de Salvador dominados por facções. Milhares de crianças estão sem aulas, trabalhadores sem transporte público, pacientes sem atendimento em postos de saúde e até comércios fechados devido à guerra do tráfico de drogas, que domina a capital baiana.
As organizações criminosas estão armadas até os dentes, facções intensificaram a circulação de armas pesadas na Bahia, principalmente fuzis. Do outro lado da guerra, a polícia tenta conter o avanço dos grupos criminosos. Uma das estratégias das forças de segurança são as operações ostensivas.
Só em setembro, mais de 70 tiroteios ocorreram na Bahia e 72 pessoas morreram nesses confrontos. Entre elas, três policiais. No fogo cruzado, está quem mora e trabalha na zona da violência.
Durante as operações, uma das estratégias dos traficantes é invadir casas e fazer reféns. No mês passado, os bandidos transmitiram tudo ao vivo pelas redes sociais, enquanto a polícia tentava negociar a soltura das vítimas.
Mortes de crianças são rastro trágico
A violência armada na Bahia é marcante também pelas mortes de crianças. Pelo menos 13 foram baleadas em 2023, três morreram. A última vítima foi Sarah de Jesus, de seis anos, atingida por tiros enquanto dormia.
Traficantes invadiram a casa da família no meio da noite, atrás do filho do padrasto dela, que não estava no local. O padrasto também foi morto baleado. Moradores das áreas de conflito são intimidados por criminosos, que chegam a vistoriar os celulares para checar se eles mantém contato com a polícia ou grupos rivais.
Educação e Saúde são afetadas
A criminalidade também afeta serviços básicos, como a educação e a saúde. 70 escolas municipais de Salvador suspenderam as aulas pela insegurança. Mais de 20 mil alunos foram prejudicados.
Para o Jornal da Band, um professor que não quis se identificar diz que é um desafio conscientizar jovens. “Tento mostrar aos alunos que não vale a pena entrar na vida do crime”, conta.
Postos de saúde também pararam. Mais de 30 unidades de saúde da capital baiana interromperam o atendimento neste ano. “Os trabalhadores ficam com medo e isso tem provocado quadros de ansiedade em muitos profissionais”, conta a enfermeira Lília Cordeiro, responsável em uma unidade de saúde de Valéria, um dos bairros mais disputados pelas facções.
Conflitos tornam a polícia baiana a mais letal
Em setembro, Salvador e a região metropolitana registraram mais que o triplo de mortes em operações policiais do que Rio de Janeiro e Recife juntos. Com a guerra contra o tráfico, as mortes são impulsionadas na Bahia. Em 2023, quase 1500 pessoas foram mortas pela polícia baiana, que se tornou a mais letal do Brasil.
Para Jurema Werneck, diretora da Anistia Internacional, é preciso confrontar a indústria do tráfico de drogas. “É preciso enfrentar a origem, não o varejo, não na porta das casas das pessoas das favelas, porque lá é a pequena parte dessa indústria”, explica.
Belle Damasceno, vice-presidente do Conselho Estadual dos Direitos Humanos, afirma que a população sofre com a violência na Bahia. “Nos últimos casos, foram pessoas que estavam na porta de casa, que estavam indo trabalhar, nem todos que morrem são criminosos”, diz.
Para a defensora pública Firmiane Venâncio, o que ocorre na Bahia é reflexo da política de drogas brasileira. “É preciso que o Congresso libere o uso de algumas drogas para diminuir o mercado ilegal e, assim, essa guerra contra o tráfico”, afirma. Tanto, que Felipe Freitas, secretário de Justiça e Direitos Humanos da Bahia, avalia que é preciso investir em prevenção. “No campo da educação, da cidadania, pra reduzir a necessidade de ações policiais e o uso da força”, pontua.