
Quando o marido de Camilla Bez foi preso há pouco mais de dois anos, a então vendedora corria para poder conciliar as visitas a ele no presídio, a volta ao trabalho e a criação da filha, que tinha pouco mais de seis meses. Em uma dessas visitas, Bez viu uma oportunidade em meio à situação difícil que vivia.
“Entrou uma regulamentação da Secretaria de Administração Penitenciária padronizando a vestimenta para visitantes em todas as unidades de São Paulo. Vi um burburinho na fila das meninas com medo de serem barradas. Ali no meio do alvoroço eu vi uma chance, já que sempre trabalhei com roupa”, conta.
Foi assim que o Bazar da Bez nasceu. Dois anos depois e com o marido livre, Camilla vende produtos para as “cunhadas”, as mulheres de presos. Ela e o marido comercializam roupas para as visitantes que vão de acordo com as normas da SAP, além de bolsas e até itens para visitas íntimas.
Nas regras gerais, a Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo permite o uso de camisetas com manga, exceto nas cores azul-marinho, branca, cáqui, marrom e preta. É permitido também o uso de calça de moletom ou legging e apenas chinelos de dedo, solado fino e alças de borracha.
Em dias de baixas temperaturas, as visitantes podem entrar nos presídios com meias e blusa de moletom, desde que não tenha capuz, forro, bolsos, botões metálicos e zíper. É proibido o uso de roupas curtas, decotadas, transparentes, com detalhes de metal, roupas sobrepostas e coberturas.
Para Camilla, a loja foi uma mudança total de vida. “Trabalho apenas com o Bazar da Bez, temos mais de 300 pedidos por mês e ainda esperamos crescer. Agora, com o Luiz Felipe em liberdade, vamos ampliar os negócios, ele já vai atrás de fornecedores, me ajuda no e-commerce”, celebra.
O Bazar da Bez conta não só com o site, mas também com atendimento por WhatsApp. Camilla afirma que já tem uma funcionária em uma loja próxima ao ponto de saída de excursões às prisões paulistas. Luiz Filipe, que foi solto em dezembro, vê que a loja da esposa é uma oportunidade de se reintegrar à sociedade.
“Ela já me colocou para trabalhar. É bom que eu sei que vou conseguir fazer algo e crescer. Trabalho para mim, não para os outros. Saímos sem expectativa, uma mão na frente e outra atrás e com preconceitos em cima. Agora não, já saí pensando em crescer”, celebra.
Negócios como o Bazar da Bez já eram conhecidos e até recomendados pela SAP para familiares e amigos de pessoas que eram presas, já que muitos não sabem por onde começar para enviar produtos, roupas ou fazer visitas que respeitem às normas dos presídios. Para a Band, a SAP informou que tais empresas são presentes e prestam serviços que facilitam a vida dos presos e dos familiares.
“Segurança e crescimento na autoestima das visitantes”
Uma das situações mais incômodas para mulheres que visitam presos é todo o processo da compra de vestuário, até passar pela revista íntima. O procedimento de segurança, inclusive, está tendo a legalidade avaliada pelo Supremo Tribunal Federal. Para evitar quaisquer situações vexatórias, lojas como a de Camilla Bez surgiram para que visitantes regulares não tenham que passar por constrangimentos.
“A mulher chega mais arrumada, a visita fica mais agradável. Você vê que tiram foto, mostram o look, vivem outra realidade do que era, aquela coisa mais tensa. Então não há mais a vergonha, a mulher levanta a cabeça e vai”, diz.
Para ela, a loja aumenta a autoestima de mulheres de presos. “O melhor é que várias outras meninas se inspiraram e hoje vemos outras lojas do tipo. É legal que vira uma coisa de acolhimento”, afirma. Nas redes sociais, é possível encontrar diversas lojas, empresas e perfis que não só vendem produtos do tipo, como também mostram a rotina de uma “cunhada” e ensinam a cumprir as normas das unidades prisionais.
“Nossa função é tranquilizar e acolher famílias”
Nascida em 2013 após um pedido de confecção de uma roupa específica para um preso, a Jumbo CDP trabalha atualmente com o envio de jumbos – kit de produtos enviados a detentos e confecção de roupas para presidiários em todo o estado de São Paulo.
Victor Albuquerque, sócio e gestor de e-commerce da loja, que hoje envia em média 3 mil jumbos e kits de roupas por mês, afirma que a função da empresa vai muito além do envio de produtos para 180 unidades prisionais de São Paulo. “Nossa função é tranquilizar, prometendo entregar em poucos cliques o jumbo e dar comodidade”, diz.
Vemos que quando uma pessoa é presa, a família fica desesperada, quer entender tudo. E como é um meio burocrático, quando o detento é preso, tem que fazer tanta documentação que elas ficam perdidas - conta Victor Albuquerque
No site da Jumbo CDP, a empresa também oferece plataformas de instrução, onde familiares podem tirar dúvidas sobre o sistema penitenciário paulista. Mas o negócio não se resume apenas ao estado de São Paulo. Victor afirma que estuda ampliar os negócios para Minas Gerais e já vende para revendedores de outros estados e cidades.
“Tem muita gente que tem lojas, existe uma grande procura. Trabalhamos até com empresas que têm funcionários detidos e que usam mão-de-obra detenta, eles enviam jumbos como um bônus”, conta.