Em apenas dez dias, o Oriente Médio vivenciou uma espiral crescente de violência. O líder do Hezbollah, Hassan Nasrallah, foi morto num ataque aéreo, Israel iniciou uma ofensiva terrestre no Líbano e o Irã lançou cerca de 180 mísseis balísticos contra Israel.
Esse acirramento se dá após quase um ano de escaramuças transfronteiriças entre Israel e o Hezbollah – considerado organização terrorista por Israel, Alemanha, Estados Unidos e vários outros países –, que antes se limitavam às regiões de fronteira, e se soma à guerra contínua de Israel contra o grupo Hamas, na Faixa de Gaza.
No sábado (05/10), o Exército israelense comunicou que suas forças haviam atingido combatentes do Hezbollah dentro de uma mesquita adjacente ao Hospital Salah Ghandour, no sul do Líbano, administrado pelo Comitê de Saúde Islâmico, organização médica afiliada ao Hezbollah. Nove dos médicos teriam sido gravemente feridos, após receberem um aviso de evacuação do prédio.
O Hezbollah confirmou que seus membros estavam em confronto com as forças israelenses no sul do Líbano e que atingiu um tanque israelense com um míssil perto da fronteira. Além disso, o teria lançado foguetes contra a base aérea israelense de Ramat David, a cerca de 45 quilômetros da fronteira libanesa.
Milhares de ataques transfronteiriços
O Hezbollah iniciou ataques a Israel há quase um ano, afirmando agir em solidariedade aos palestinos de Gaza, enquanto Israel travava uma guerra no enclave contra o Hamas, em resposta ao ataque terrorista de 7 de outubro de 2023. O conflito se intensificou ainda mais em 1º de outubro de 2024, quando Israel entrou com tropas no sul do Líbano.
Como mostra o gráfico, o número de ataques israelenses ao Líbano triplicou na semana que antecedeu a operação terrestre, enquanto os contra-ataques do Hezbollah também aumentaram, embora em menor proporção.
Israel realizou aproximadamente 8.300 ataques ao longo da fronteira de 120 quilômetros, quase quatro vezes o número lançado pelo Hezbollah. O governo israelense afirma que suas operações militares têm como objetivo impedir que o Hezbollah lance foguetes e drones sobre a fronteira, como tem ocorrido quase diariamente ao longo dos últimos 12 meses.
O antigo líder do grupo Hassan Nasrallah, morto em 27 de setembro, num bombardeio israelense, havia declarado que o Hezbollah não buscava uma guerra mais ampla, mas que responderia às ações de Israel. Após sua morte, a nova liderança do Hezbollah prometeu continuar a luta, enquanto Israel intensificava seus ataques aéreos em todo o Líbano.
Ataques aéreos a Beirute e mais além
Nos últimos dias, Israel intensificou os ataques aéreos em Beirute, visando especificamente Dahieh, um reduto do Hezbollah nos subúrbios ao sul da cidade. Essa área densamente povoada, que abriga milhares de civis, foi várias vezes atingida, e o próprio Nasrallah foi morto num ataque aéreo na área.
As investidas aéreas pelas Forças de Defesa de Israel (IDF) ao longo da fronteira com o Líbano também se intensificaram, pois buscariam, segundo a organização militar, desmantelar a infraestrutura do Hezbollah.
Além disso, tendo como alvo membros do Hamas, Israel bombardeou Trípoli, a segunda maior cidade libanesa, localizada no norte, a aproximadamente 80 quilômetros da fronteira. No sábado o Hamas anunciou que um ataque aéreo em Trípoli matara um de seus comandantes de campo, Saeed Atallah Ali, juntamente com sua esposa e duas filhas.
Na cidade oriental de Saadnayel, perto do Vale do Becaa, outro ataque aéreo resultou na morte de Muhammed Hussein al-Lawis, que o Exército israelense identificou como a "autoridade executiva" do Hamas no Líbano.
Situação ao longo da fronteira
Quando as IDF iniciaram a incursão terrestre no sul do Líbano, os comandantes declararam que suas operações seriam localizadas e direcionadas, com o objetivo de desmantelar as capacidades do Hezbollah e impedir que a milícia disparasse foguetes e artilharia contra as cidades do norte de Israel.
No entanto, há exigências crescentes da linha-dura israelense, inclusive de membros do governo, por objetivos militares mais amplos, como o estabelecimento de uma "zona tampão" permanente no território libanês.
Por exemplo, Amichai Chikli, ministro da Diáspora e do Combate ao Antissemitismo de Israel, chegou a afirmar que "o Líbano, apesar de ter uma bandeira e instituições políticas, não se enquadra na definição de país". Ele acrescentou que é imperativo eliminar populações inimigas, enfatizando ser tanto uma necessidade de segurança quanto um imperativo moral.
Israel sempre exigiu que o Hezbollah se retirasse para além do rio Litani, cerca de 30 km ao norte da fronteira estabelecida pelas Nações Unidas após a guerra de 2006. As IDF também ordenaram que residentes de 30 vilarejos no sul do Líbano se mudassem mais para o norte, para além do rio Awali.
Mortos e deslocados internos
O conflito desalojou 1,2 milhão no Líbano, de acordo com as autoridades locais. Os abrigos para deslocados estão com sua capacidade esgotada, forçando muitas famílias a acamparem ao longo da orla de Beirute ou nas praias próximas. Mais de 2 mil cidadãos foram mortos desde 2023, segundo o Ministério da Saúde do Líbano.
Do lado israelense, pelo menos 34 morreram no norte de Israel, devido aos disparos na região de fronteira, de acordo com relatórios do governo. Além disso, cerca de 68 mil residentes de comunidades do norte continuam deslocados, de acordo com o Knesset, o parlamento israelense.
A incursão terrestre resultou num aumento das baixas militares nas IDF. Em 2 de outubro, apenas um dia após o início da invasão, as IDF confirmaram a morte de oito soldados – as primeiras da campanha terrestre. Na sexta-feira, o Hezbollah afirmou ter matado 17 soldados israelenses em confrontos perto da fronteira.
A guerra de várias frentes de Israel
O conflito vai bem além da fronteira entre Israel e Líbano. Israel está agora envolvido em operações militares em várias frentes, incluindo Gaza, Líbano e vários outros locais do Oriente Médio.
O Irã, um dos principais apoiadores do Hezbollah, interveio diretamente duas vezes desde abril, atacando alvos israelenses com foguetes. A série de mísseis lançados em 1º de outubro marcou uma escalada significativa no conflito, com o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, prometendo uma retaliação rápida, pois o Irã teria cometido um grande erro e pagaria por ele.
O que permanece incerto é tanto a duração futura do conflito de várias frentes de Israel continuará, quanto a extensão de suas possíveis consequências. Com as hostilidades envolvendo vários atores regionais, o risco de uma guerra mais ampla e devastadora é grande.
Autor: Monir Ghaedi