O plano de um ministro para salvar a indústria alemã

A economia da Alemanha caminha para a recessão, e um dos motivos é o alto custo da energia usada nas fábricas. Robert Habeck, ministro da Economia, quer mudar isso com subsídios, mas enfrenta forte oposição.

Por Deutsche Welle

O plano de um ministro para salvar a indústria alemã
Robert Habeck, ministro alemão
REUTERS/Liesa Johannssen

O clima é ruim. Enquanto as principais nações industrializadas registram crescimento, a Alemanha caminha para uma recessão, com retração de 0,4% prevista para este ano. Um levantamento feito pela Confederação das Associações de Empregadores Alemães (BDA) em outubro apontou que 82% dos empresários estão muito preocupados com o país como local para fazer negócios, e 88% acreditam que o governo não tem uma estratégia clara para superar a crise.

O ministro da Economia, Robert Habeck, do Partido Verde, entende as críticas e até concorda com elas. A situação geopolítica; a cara, porém necessária transformação para uma indústria neutra em carbono; infraestrutura negligenciada; deficiências na digitalização; ausência de trabalhadores qualificados; e muita burocracia. Tudo isso exerce enorme pressão sobre a indústria. Com uma participação de pouco menos de 23% do valor agregado bruto, porém, o setor ainda é o núcleo da economia alemã.

Estratégia para a indústria

Em meados de outubro, Habeck apresentou uma estratégia para a indústria. Em um documento de 60 páginas, o ministro explicou por que acredita ser importante fornecer apoio estatal maciço para a economia alemã nos próximos anos.

A abordagem é semelhante à dos EUA, que lançou um programa de investimentos no valor de quase 740 bilhões de dólares por meio do Inflation Reduction Act. Além de medidas para combater as mudanças climáticas e uma reorientação da economia para as energias renováveis, o programa americano também prevê amplo alívio tributário.

O problema na Alemanha, porém, envolve política: a estratégia de Habeck não foi acordada dentro da coalizão governamental, formada também pelo Partido Social-Democrata (SPD) e pelo Partido Liberal Democrático (FDP). Alguns membros do governo ficaram surpresos com o fato de o ministro estar avançando nessa pauta. Outros a interpretam como uma tentativa de trazer os verdes de volta às manchetes de forma positiva após os problemas com a discussão sobre converter os sistemas de aquecimento residencial para o uso de energias renováveis.

Após muita polêmica, a norma foi aprovada em setembro no Bundestag (câmara baixa do Parlamento alemão) e prevê que novas construções tenham sistemas de aquecimento com pelo menos 65% de energia renovável, entrando em vigor em 1º de janeiro de 2024, embora muitas regulamentações devam ser implementadas somente nos anos seguintes.

Desta vez, as demandas de Habeck para a indústria seriam bem recebidas não só pelos empresários, mas também pelos sindicatos, já que ambos os lados, nesses tempos difíceis, querem ajuda do Estado.

Seis centavos de dólar por quilowatt-hora

Um componente central da estratégia de Habeck é um preço de eletricidade altamente subsidiado. Durante décadas, o modelo econômico alemão baseou-se em produtos fabricados com energia barata – principalmente por meio de gás proveniente da Rússia – e vendidos em todo o mundo a preços altos.

A Alemanha era uma campeã mundial de exportações, e o "Made in Germany" era o selo de qualidade. Mas, desde que a Rússia invadiu a Ucrânia, o gás não chega mais diretamente via gasoduto, e sim por navio, muito mais caro, na forma de gás natural liquefeito (GNL).

Desde então, os preços de energia, bem como os da eletricidade, explodiram, ficando entre os mais altos do mundo. Para a população, a eletricidade chegou a 40 centavos de euro por quilowatt-hora, enquanto o setor industrial paga 24 centavos. Há meses, Habeck pressiona pela introdução de um preço subsidiado pelo governo para a eletricidade industrial no valor de seis centavos por quilowatt-hora.

Oponentes na própria coalizão

Habeck, no entanto, enfrenta dificuldades mesmo entre seus colegas de partido. Tornar o consumo de energia mais barato não é uma demanda central dos verdes, que, no entanto, reconhecem que a população não deve ser sobrecarregada, especialmente com preços altos de energia, já que isso aproxima cada vez mais os cidadãos de partidos extremistas.

Essa opinião é compartilhada por parlamentares do SPD, do chanceler Olaf Scholz, mas ele se mostra cético sobre o tema. Scholz teme que uma eletricidade barata aumente a demanda e, consequentemente, crie gargalos.

Especialistas acreditam que a eletricidade permanecerá cara na Alemanha por muito tempo. E Scholz teme que as empresas que obtenham energia subsidiada por um longo período escapem da pressão para tornar suas operações neutras em carbono.

O maior oponente de Habeck é o parceiro de coalizão FDP, já que o orçamento consolidado pelo ministro das Finanças, o liberal Christian Lindner, não prevê bilhões de euros para subsídios adicionais.

Energia cara dificulta produção

Além de Habeck, também o setor industrial e os sindicatos alertam para o fato de que a indústria alemã pode ter graves problemas sem eletricidade subsidiada. Segundo declarou o ministro durante uma conferência da área em Berlim, há uma ameaça de "perda da produção intensiva de energia e, portanto, do núcleo do que compõe a cadeia de valor industrial da Alemanha".

Desde os produtos mais básicos até o acabamento, o país tem cadeias de suprimentos "em boas condições".

"É claro que também podemos ter manufatura, mas então enfraquecemos o que é local. Em termos políticos, decidi que essa é exatamente a consequência errada neste momento", argumentou Habeck.

Empresas e sindicatos apelam

Além de Habeck, também o setor industrial e os sindicatos alertam para o fato de que a indústria alemã pode ter graves problemas sem eletricidade subsidiada. Segundo declarou o ministro durante uma conferência em Berlim, há uma ameaça de "perda da produção intensiva em energia e, portanto, do núcleo que compõe a cadeia de valor industrial da Alemanha".

A Federação das Indústrias Alemãs (BDI) alerta há tempos contra a migração de empresas que usam energia de forma intensiva para outros países. Isso teria consequências graves, como enfatizou o presidente da BDI, Siegfried Russwurm, na conferência do setor em Berlim: "Se não houver indústrias químicas, é ilusório supor que a automação das fábricas de produtos químicos continuará a ocorrer na Alemanha."

Segundo Jürgen Kerner, presidente do sindicato dos metalúrgicos, não se trata apenas de salvar as grandes companhias: "Muitas empresas familiares de médio porte atualmente não têm perspectivas", disse.

Há uma grande incerteza em todo o país, já que a produção está sendo transferida para o exterior ou descontinuada: "Temos empresas de alumínio que estão parando de produzir, temos fundições e forjarias onde encomendas estão sendo perdidas. Os conselhos de trabalhadores e os gestores de falência relatam demissões, insolvências e fechamento de fábricas."

De onde deve vir o dinheiro?

Durante a conferência do setor industrial em Berlim, não houve consenso sobre como o subsídio para a eletricidade poderia ser financiado. Habeck e os verdes estão abertos a contrair mais dívidas. Não neste período legislativo – afinal, o freio da dívida consta no acordo de coalizão –, mas sim após a próxima eleição federal, de acordo com o ministro da Economia.

Russwurm, por outro lado, é contra novas dívidas pelo fato de o Estado alemão já ter problemas com gastos: "Acredito que teremos que priorizar e enfrentar esse impasse: o que podemos pagar e o que seria desejável, mas que não pode ser bancado."

O tema também está em debate nas negociações orçamentárias para 2024 no Bundestag. Habeck se referiu a isso ao ser questionado quando o SPD, os verdes e o FDP chegariam a um acordo sobre o preço da eletricidade para a indústria. "Talvez os debates orçamentários tragam alguma clareza", respondeu.

Autor: Sabine Kinkartz

Tópicos relacionados

Mais notícias

Carregar mais