Por que entregadores de app querem entrar em greve?

Após meses de negociações mediadas pelo governo, empresas de aplicativos e empregados não conseguem chegar a acordo

Por Deutsche Welle

Por que entregadores de app querem entrar em greve?
Por que entregadores de app querem entrar em greve?
Rovena Rosa/Agência Brasil

Os entregadores de aplicativos como o iFood estão tentando articular uma greve nacional e devem parar nesta sexta-feira (28/09), pelo menos no Rio de Janeiro,São Paulo e Distrito Federal.

A greve estava inicialmente marcada para 18 de setembro, mas foi adiada devido à continuação das negociações entre empregados e empresas num grupo de trabalho de mediação criado pelo governo.

Por que a paralisação?

Depois de muitas negociações, as empresas de aplicativos e seus funcionários não conseguiram chegar a um acordo sobre os valores a serem pagos e o parâmetro de contabilização, entre outros pontos em discussão.

A exigência é de um mínimo de R$ 35,76 por hora logada para motoristas e motociclistas, e de R$ 29,63 para os ciclistas. Par sua vez, as empresas só querem pagar R$ 17 por hora trabalhada para motoristas e até R$ 7 para os ciclistas.

A hora logada começa a contar quando o trabalhador se conecta no aplicativo e está, assim, à disposição para fazer corridas. A hora trabalhada só conta quando o trabalhador estiver transportando um cliente ou mercadoria.

Para os empregados, o pagamento por hora logada é inegociável, mas as empresas dizem que esse modelo é inviável e argumentam que um trabalhador está disponível em mais de um aplicativo durante a jornada de trabalho. Essas posições inconciliáveis levaram a um impasse.

Qual é a situação atual?

Entregadores afirmam que, em média, o pagamento por hora logada caiu pela metade depois da popularização dos aplicativos, passando para cerca de R$ 10 em 2023.

Um relatório da Universidade de Oxford afirmou que os principais apps de entrega e transportes não garantem o pagamento mínimo de R$ 6 por hora, o que equivaleria à hora do salário-mínimo.

O relatório também constatou que nenhuma empresa oferece condições de trabalho justas, incluindo treinamento e fornecimento de equipamentos de segurança e saúde.

O que já foi feito?

Em maio, o Ministério do Trabalho criou um grupo de trabalho para discutir o tema, com a participação das empresas de aplicativos, membros do governo federal e representantes dos entregadores e dos motoristas que transportam passageiros.

As entidades empresariais são duas: o MID (Movimento Inovação Digital), que engloba mais de 100 empresas, como Americanas, Rappi, Loggi, OLX, Paypal, InDrive, Alice, Quinto Andar, Sypla e Mercado Livre, e a Amobitec (Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia), que reúne Amazon, iFood, Uber, Buser, Zé Delivery, FlixBus, Quicko e 99.

O grupo de trabalho começou as negociações em junho e as encerrou no início da terceira semana de setembro, sem acordo entre as partes. Além da questão da remuneração, outros pontos discutidos foram contribuição para a Previdência, vale-seguro, vale-refeição e indenização pelo uso dos veículos.

Os entregadores e motoristas argumentam que os aplicativos não são empresas de tecnologia, mas de transportes, e por isso devem seguir a legislação desse setor.

E como fica agora?

Diante do impasse, o Ministério do Trabalho sinalizou que deverá apresentar um projeto de lei ao Congresso Nacional até o fim de setembro.

Detalhes não foram divulgados, mas, segundo o site Jota, o governo estaria cogitando uma remuneração mínima de R$ 30 por hora trabalhada para os motoristas de carro e de R$ 17 para os de motos, o que desagrada os trabalhadores, que defendem a hora logada.

Pelo projeto, cada categoria deve receber R$ 7,50 como ganho líquido pela hora trabalhada. Sobre esse valor haverá a incidência de 27,5% de contribuição previdenciária, com as empresas arcando com 20%, e os motoristas, com 7,5% sobre o valor líquido total. Já os entregadores pagarão a alíquota sobre metade do ganho líquido, ou seja, 7,5% sobre R$ 3,75, segundo o Jota.

A intenção, ao marca a greve para o dia 29, é justamente pressionar o governo pouco antes da apresentação do projeto de lei. Os trabalhadores já demonstraram em diversas ocasiões insatisfação ou decepção com a postura oficial.

O que disse o presidente Lula?

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou nesta segunda-feira, no Itamaraty, que não pretende obrigar as empresas de aplicativos a assinarem a carteira profissional de quem trabalha para elas.

Já no programa Conversa com o Presidente, Lula declarou: "O que nós queremos é que vocês sejam tratados com a dignidade que todo ser humano tem que ser tratado e receber um salário que permita vocês comerem pelo menos a comida que vocês entregam. Não é humano você carregar comida nas costas e estar com o seu estômago vazio."

Em 20 de setemrbro, ao lado do presidente dos EUA, Joe Biden, Lula assinou o documento Coalizão Global pelo Trabalho, defendendo garantias aos trabalhadores por aplicativo.

Quantos trabalham no setor?

Brasil tem 1,6 milhão de trabalhadores para aplicativos, sendo 386 mil entregadores de plataformas e 1,27 milhão motoristas de apps de caronas, segundo uma pesquisa do Cebrap.

Os homens são a ampla maioria dos empregados, chegando a 97%. No caso dos entregadores, a maioria tem menos de 30 anos, ao passo que maior parte dos motoristas tem menos de 40 anos. Só a Uber declara ter 1 milhão trabalhando para ela no Brasil. Porém os motoristas podem trabalhar para mais de um aplicativo.

"As empresas de aplicativos continuam fugindo de suas responsabilidades sociais com milhões de entregadores em todo o Brasil que, na realidade, não são autônomos e sim trabalhadores em situação de precarização e escravização", argumentou a Federação Brasileira dos Motociclistas Profissionais (Febramoto).

Autor: Alexandre Schossler

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