A busca por vítimas e a identificação de corpos estão em andamento em Kharkiv. No último sábado (25/05), a Rússia disparou duas bombas guiadas em uma loja de materiais de construção. Até o momento, pelo menos 18 pessoas foram mortas e mais de 40 ficaram feridas, e sete pessoas ainda estão desaparecidas.
Uma repórter da DW esteve em Kharkiv na semana passada quando houve um alerta de ataque aéreo de 16 horas. Era impossível dormir à noite porque a cidade estava sendo atacada por mísseis e drones. Mas, pela manhã, Sashko, de 9 anos, levantou da cama, penteou o cabelo, tomou o café da manhã e foi para a escola – pela primeira vez em mais de dois anos desde o início da invasão russa na Ucrânia.
Escola subterrânea para quase 900 crianças
"Uma campainha escolar de verdade", festeja a professora Natalia Schwez, dirigindo-se aos alunos da terceira série, enquanto eles se sentam em suas carteiras. "Dou as boas-vindas a todos vocês na escola subterrânea".
Há 11 crianças na turma, todas vestindo blusas e camisas bordadas. Outras nove assistem online, do exterior. A professora está tão feliz com as aulas presenciais quanto as crianças. Ela viu seus alunos pessoalmente pela última vez em 23 de fevereiro de 2022. "Na manhã seguinte, ouvimos explosões", Schwez se lembra do dia em que a invasão começou. "Alguns fugiram da guerra, outros pensaram que as escolas ficariam abertas, mas todos se perguntaram como as aulas continuariam."
A partir de então, as aulas passaram a ser só pela internet. A Rússia já destruiu mais da metade das escolas da cidade. Por isso, no ano passado, as autoridades locais começaram a instalar salas de aula em estações de metrô para mais de dois mil alunos.
Em 13 de maio, começou a funcionar uma escola subterrânea inteira a uma profundidade de seis metros. Ela tem espaço para quase 900 crianças, que assistem às aulas em dois turnos. A cidade quer criar mais escolas desse tipo em vários bairros.
Infância em meio à guerra
"Minha mãe era criança durante a guerra. Eu nunca imaginaria que minha filha e essas crianças também passariam suas infâncias em meio à guerra. Elas continuam ouvindo frequentemente explosões", diz a professora Natalja Schwez. Sua filha terminou a escola durante a guerra, mas não houve o tradicional baile com vestido de noite e dança.
Na escola subterrânea, as aulas começam com o hino nacional ucraniano. Os alarmes antiaéreos soam com frequência durante as aulas, e vez ou outra a eletricidade é desligada em partes da cidade, conforme planejado. Mas os alunos da escola subterrânea permanecem em suas carteiras – lá, continuam existindo todas as condições para a aula.
Até agora, Saschko só havia participado das aulas online. "Não era bom, eu ficava com dor nos olhos, e faltava luz um monte de vezes", diz o garoto. E quando as aulas eram interrompidas por explosões, ele corria para o corredor do apartamento para se proteger. "Mas acabei me acostumando", enfatiza, referindo-se ao constante bombardeio russo.
Saschko diz que sentia falta das aulas presenciais, mas percebeu que frequentar uma escola normal era muito perigoso. Afinal de contas, um foguete poderia atingir as proximidades. "Se só acertassem os prédios, ia ser menos trágico e triste do que com pessoas morrendo", diz o aluno da terceira série.
"Não quero ir para o exterior sem meu pai"
Desde o início de maio, o Exército russo está conduzindo uma ofensiva no norte da região de Kharkiv, tendo intensificado bombardeios contra a cidade de Kharkiv e, aparentemente, tentando se aproximar dela. Os habitantes da cidade sabem o que isso significa: suas casas podem voltar a ser alvo de fogo de artilharia, como aconteceu no início da invasão. Embora não haja pânico na cidade, muitos estão pensando em se mudar.
A família de Sashko também pode ter que deixar Kharkiv. "Mas eu não quero ir para o exterior sem meu pai", diz o menino com tristeza, e quer ficar, apesar do bombardeio. "Moro aqui há nove anos", diz Sashko, que nasceu em Kharkiv. Ele visitou outras cidades, mas nenhuma delas lhe agradou. "Sempre senti falta da minha casa", ressalta.
Serhiy Antonov, que leva seu filho Sashko à escola subterrânea, para por um momento na porta da sala de aula. "Isso é realmente uma alegria para nossos filhos", ele sorri e tira uma foto de seu filho sentado em sua carteira.
Yegor, outro aluno da mesma turma, é levado à escola por sua mãe. Tanto o pai do menino quanto seu irmão mais velho estão servindo no Exército ucraniano e na frente de batalha. "Fiquei muito triste", lembra-se Yegor do dia em que soube que ambos teriam de ir para a guerra. "Quero que a guerra acabe", diz ele e corre para seus colegas de classe, pois o intervalo havia acabado de começar. Com eles, ele acha distração para seus pensamentos tristes.
"Kharkiv é a cidade mais forte"
À tarde, as aulas na escola subterrânea terminam e, de repente, outro míssil russo atinge a cidade. Desta vez, um prédio residencial é atingido, matando três pessoas e ferindo mais de 30. "Isso não tem fim", diz a professora Natalja Schwez sobre os ataques russos. "É um estresse constante para nós. Mas estamos aguentando. Tomamos a decisão de ficar em Kharkiv. Este é o nosso lar", destaca.
Uma coluna alta de fumaça preta se ergue sobre o centro de Kharkiv. As pessoas olham para ela, mas continuam andando pelas ruas. No ar, há um cheiro de acácias florescendo e de flores que são cuidadosamente plantadas em canteiros. As janelas e os telhados dos edifícios destruídos estão cobertos com folhas de compensado. "A cidade está sendo bombardeada e reconstruída ao mesmo tempo. Kharkiv é mesmo a cidade mais forte", diz Saschko quando lhe perguntam por que ele não quer ir embora.
"A Ucrânia tinha 48 milhões de habitantes, mas de três a cinco milhões deles foram embora", diz o garoto com tristeza. Centenas de civis foram vítimas dos constantes ataques a Kharkiv. "A Rússia os matou", está escrito em uma pedra memorial dedicada às crianças mortas nessa guerra. No entorno, estão animais de pelúcia e flores frescas.
Apenas alguns dias depois, os russos atacam Kharkiv novamente, com 10 mísseis. Sete pessoas morrem, incluindo funcionários de uma empresa de impressão de livros infantis.
Autor: Hanna Sokolova-Stekh (de Kharkiv)