Transição verde eleva preços do cobre e impulsiona furtos

Brasil é um dos cinco país do mundo mais afetados pelo roubo de fios e cabos do metal. Situação impacta diretamente consumidores, que têm serviços de luz e telecomunicações interrompidos.

Por Deutsche Welle

O aumento nas interrupções de serviços como luz e telecomunicações no Brasil pode ser impulsionado pela busca por metais valiosos para a transição energética, principalmente, o cobre. O aumento nos furtos de fios deste metal tem uma relação direta com a explosão nos preços internacionais do cobre, o que levou também a uma mudança no perfil dos criminosos.

Nos últimos seis meses, o cobre na London Metal Exchange (LME), referência das cotações de metais, avançou mais de 10%, ficando cotado próximo dos 9 mil dólares por tonelada. Apenas em março, a alta foi superior a 4%. O quadro consolida um novo patamar de preços que vem desde a pandemia. Antes, o cobre não costumava passar dos 6 mil dólares, mas os choques na oferta causados pelas restrições do período e o avanço de indústrias como a de carros elétricos e de paneis solares, que usam grandes quantidades do metal, repercutiram na cotação.

Na visão de uma série de analistas, o boom está apenas começando, e a alta deve seguir em forte nos próximos trimestres. Além disso, a atividade industrial na China e a política monetária dos Estados Unidos são temas observados pelos investidores.

"Se espera que o lado da demanda aumente lentamente neste ano, especialmente no setor da energia verde. Nos veículos elétricos, o cobre é uma componente chave que é usado em motores, baterias e fiação, bem como em estações de carregamento", aponta a analista de commodities do banco ING Ewa Mantley, em relatório.

"O cobre não tem substituto para a sua utilização em veículos elétricos, energia eólica e solar, e o seu apelo aos investidores como um metal verde fundamental apoiará preços mais elevados nos próximos anos", afirma ainda. Alguns analistas apostam que o metal atingirá 15 mil dólares por tonelada em 2025.

No caso dos ferros-velhos brasileiros, a mudança de patamar de preços foi bastante sentida. Hoje, o cobre é cotado em cerca de R$ 40 o quilo, segundo uma série de tabelas disponíveis online em perfis sobre o tema. Antes da pandemia, o metal costumava ser cotado entre R$ 15 e R$ 20, nas categorias conhecidas como "mel" e "misto".

A relação do avanço dos preços da commodity com a alta de furtos é bastante conhecida, e não é exclusividade do Brasil. No estudo intitulado Roubo de cobre: uma preocupação crescente para as indústrias em todo o mundo, a empresa Faster Capital destacou o Brasil como uma das cinco nações mais afetadas pelo problema, junto de Estados Unidos, Índia, África do Sul e China.

Segundo a publicação, o país sofreu um aumento nos incidentes do tipo, impulsionado principalmente pelos extensos projetos de infraestrutura e pelo alto valor do cobre no mercado negro. Cerca de 30% do cobre comercializado no Brasil tem origem ilícita, um mercado que movimenta cerca de R$ 2,4 bilhões ao ano, segundo o Sindicato da Indústria de Condutores Elétricos, Trefilação e Laminação de Metais Não Ferrosos do Estado de São Paulo (Sindicel).

Lucratividade atrai novos atores

O furto de fios de cobre era visto tradicionalmente como uma questão envolvendo pessoas socialmente vulneráveis, com destaque para dependentes químicos. No entanto, nos últimos anos, grupos mais especializados passaram a atuar nestas ações no Brasil, que realizam operações maiores contando até com funcionários ligados às companhias detentoras dos fios.

Em setembro de 2023, uma falsa equipe de manutenção de equipamentos de telefonia foi presa em flagrante na zona sul da capital paulista com 118 metros de cobre roubado, material avaliado em R$ 36,8 mil. Os criminosos estavam uniformizados e utilizavam um veículo que simulava uma empresa deste setor.

Em março deste ano, um funcionário de uma terceirizada de cabeamento de telefonia foi preso em flagrante por receptação qualificada e revenda online de fios de cobre e de chumbo em Belo Horizonte. Foram apreendidos 315 quilos de material prontos para envio a um ferro-velho.

Aumento constante no Brasil

Em 2023, mais de 5,4 milhões de metros de cabos de telecomunicações foram furtados no Brasil, uma alta de 15% com relação ao ano anterior, segundo levantamento do Sindicato Nacional de Empresas de Telefonia (Conexis). Em comparação com 2021, o avanço foi de 31,70%.

Segundo Daniela Martins, diretora de Relações Institucionais da Conexis, um fator que contribui para este cenário é o interesse dos receptadores pelos materiais. "As punições brandas, que não reconhecem o impacto desses crimes para a sociedade, também são outro fator que vemos como relevante", avalia.

"O aumento nos preços internacionais do cobre pode ser um fator que torna os cabos de telecomunicações mais valiosos no mercado ilegal, o que pode impulsionar o aumento dessas ações", acrescenta Martins.

A explosão nos roubos de fios e cabos de cobre levou a Câmara Municipal de São Paulo a instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre o tema no ano passado. Na ocasião, representantes da companhia energética Enel apontaram que os furtos deste material na Grande São Paulo tiveram um aumento exponencial superior a 1000% nas ocorrências no período de 2018 a 2022. De acordo com os dados, somente de 2021 a 2022, os casos aumentaram mais de 121%.

"O elo perverso nessa corrente é o receptador, que é quem incentiva isso. Quando o preço do cobre sobe no exterior, aumentam os furtos de fios aqui", afirmou em seu Instagram o vereador Coronel Salles (PSD), relator da CPI.

Em nota à DW a Secretária de Segurança Pública de São Paulo afirmou: "na Capital, a 3ª Delegacia da Divisão de Crimes Patrimoniais realiza operações e investigações constantes em ferros-velhos e demais locais de venda de metais, para combater esses delitos. Neste primeiro bimestre de 2024, já foram apreendidas 20,1 toneladas de fios".

Interrupções de todo tipo

Os prejuízos para consumidores com os furtos são inúmeros. Segundo o Conexis, 7,6 milhões de brasileiros foram diretamente afetados pelo problema ao longo de 2023. As empresas do setor lembram que, além das interrupções dos serviços, os custos com o reparo das fiações acabam impedindo ampliações e melhoras na infraestrutura.

"Em uma sociedade cada vez mais conectada, isso resulta em prejuízos financeiros para quem trabalha usando a internet e, também, na prestação de serviços públicos como bombeiros, polícia e emergências médicas", afirma Martins.

Na CPI, a central de operações da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) de São Paulo relatou que, em 2021, foram registradas 4.798 falhas em semáforos em decorrência de furtos de fios de cobre, em 2022, foram 5.900 ocorrências e, até final de abril de 2023, foram contabilizadas 2.223 falhas. A Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) também expôs os prejuízos às suas operações com o problema.

Autor: Matheus Gouvea de Andrade

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