Idosa tenta recuperar apartamento vendido sem a assinatura dela

Dona de casa Maria Helena Silva do Nascimento foi morar em Minas Gerais e deixou o imóvel vazio no Rio de Janeiro. Quando voltou, descobriu que não era mais proprietária

Por Carlos Briggs

Idosa tenta recuperar apartamento vendido sem a assinatura dela Reprodução/Google Street View
Idosa tenta recuperar apartamento vendido sem a assinatura dela
Reprodução/Google Street View

Uma idosa de 75 anos denuncia que tenta recuperar o próprio apartamento, vendido através de uma procuração ilegal e que ela nunca assinou. A dona de casa Maria Helena Silva do Nascimento foi morar em Minas Gerais e deixou o imóvel vazio no Rio de Janeiro. Quando voltou, descobriu que não era mais proprietária.  

O filho dela, Anderson Rodrigo Sampaio do Nascimento, foi quem descobriu a transação.

Cleir Martins Rodrigues foi quem comprou o imóvel. A venda foi feita através de procuração em nome de Andreia Santos Lobo Cavalvante. Cleir e Andreia se revezam na administração do condomínio onde morava Maria Helena.  

O apartamento 1.102 fica na Rua Moacir de Almeida, número 219, bloco 2, em Tomás Coelho, na Zona Norte do Rio. A venda foi feita no dia 10 de novembro de 2014, no 17º Cartório de Notas da Capital. A BandNews FM teve acesso a uma cópia do Registro de Imóveis. A transação foi confirmada pelo cartório através das informações fornecidas pela reportagem. Além de Maria Helena, o marido, Aluisio do Nascimento e a irmã dela, Maria Lúcia da Silva também tinham a propriedade do imóvel. A procuração teria sido dada pelo três, em favor de Andreia.

Ocorre que Maria Lúcia morreu em março 2005, por complicações em função de um câncer no estomago. Já Alusio faleceu em setembro de 1994, por conta de um infarto. Assim, a venda do imóvel foi realizada nove anos após a morte de Maria Lúcia e vinte anos após a morte de Aluísio.

Especialistas ouvidos pela BandNews FM afirmam que a procuração perde a validade após a morte da pessoa que concedeu os poderes. O advogado Marcus Vinicius Pessanha, mestre em Direito Administrativo e Regulatório afirma que o documento não tem validade no meio jurídico.

A procuração foi feita no cartório de Notas do 1º Ofício de Nilópolis, na Baixada Fluminense. O local fica a cerca de quarenta quilômetros do imóvel, em Tomas Coelho.

Desconfiados da legalidade da venda do apartamento, os advogados da família Nascimento solicitaram segunda via desta procuração. O valor de R$ 97,00 foi pago no dia 15 de outubro do ano passado. Até hoje, o documento não foi entregue à família, de acordo com o escritório que representa os direitos dos herdeiros do imóvel. Nossa equipe de reportagem também questionou, por três oportunidades, o motivo de o cartório não emitir a segunda via da procuração aos parentes da Dona Maria Helena, mas a única resposta que obtivemos foi que o pedido estava sendo analisado internamente.

Por outro lado, as pessoas que vivem no mesmo prédio parecem ter a resposta. Eles afirmam que há outros casos de invasão a apartamentos de moradores. As identidades foram preservavas e as vozes distorcidas. 

Nós procuramos Andreia Santos Lobo Cavalcante, que negou ter vendido o apartamento 1.102, através de procuração.

Este morador faz uma revelação ainda mais grave: relata outro caso de fraude envolvendo o mesmo cartório de Nilópolis. Ele pediu apenas para ter a identidade preservada.

Em 2014, a Caixa Econômica Federal informou ao 1ª Ofício de Justiça de Nilópolis, na Baixada Fluminense, a existência de procuração obtida mediante fraude e lavrada pelo próprio cartório. A procuração foi assinada nove meses antes, em janeiro do mesmo ano. O documento envolvia a venda de um imóvel em Nova Friburgo, na Região Serrana e a cerca de 160 km de distância do cartório de Nilópolis. A suposta assinatura concedendo poderes ao vendedor é de uma mulher, até então proprietária do apartamento, mas que faleceu quatorze anos antes, em 2000.

No processo judicial, o cartório reconheceu a fraude e ainda alegou que contou com a participação de um funcionário da Caixa Econômica Federal. A pessoa deixou de consultar o sistema SICOW, interligado ao INSS, para verificar se uma das partes era falecida. Esse procedimento é exigido antes da formalização do contrato particular de compra e venda com financiamento.

Em outubro do ano passado, Maria Helena Silva entrou com processo judicial contra o atual síndico do condomínio, Cleir Martins Rodrigues, pedindo a reintegração da posse do apartamento 1.102 do bloco 2 do Condomínio Vivenda de Tomás Coelho. A petição protocolada pela defesa de Maria alega que Cleir e Andreia Santos Lobo utilizaram documentos fraudulentos para tomar posse do apartamento.  

A defesa protocolou nos autos do processo os documentos comprobatórios e pediram deferimento de liminar para reintegração imediata da posse. Treze dias depois, o juiz Luiz Claudio Silva Jardim Marinho negou o pedido. O magistrado alegou que a certidão de ônus reais, documento que mostra a situação do imóvel, indica a venda do apartamento e que, a rigor, documentos públicos devem ser tidos como legítimos. Além disso, o juiz afirma que a liminar somente pode ser avaliada de forma adequada após manifestação da parte acusada.

O processo que apura a ilegalidade da venda do apartamento foi remetido para as alegações do Ministério Público. O promotor Rodrigo Espínola requisitou à Polícia Civil a realização de diligências para finalizar a investigação que apura a validade de documentos que comprovariam a realização de transações imobiliárias.  

Enquanto aguarda um desfecho para o caso, a idosa aguarda uma reposta: quem assinou em nome dela, além do marido e da irmão, já falecidos, uma procuração autorizando Andreia Santos Lobo Cavalcante.

A família Nascimento procurou a Polícia Civil e fez um boletim de ocorrência no dia 6 de outubro do ano passado.

Nós tentamos contato com Cleir Martins Rodrigues, mas não obtivemos êxito.

Sobre a irregularidade na venda do imóvel em Nova Friburgo, a Caixa Econômica Federal informou que não presta informações sobre operações financeiras específicas em razão do sigilo bancário. Mas que o caso informado pela reportagem não está com financiamento vigente sobre o referido imóvel. Por fim, o comunicado acrescenta que o banco possui programa de conformidade para evitar fraudes.

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