Já foi comprovado que animais domésticos não transmitem o novo coronavírus, mas nem por isso muitos deles deixam de sofrer consequências com a pandemia. Depois de uma alta expressiva na procura pela adoção de cães e gatos nos primeiros meses da quarentena, o movimento agora é inverso e com um agravante cruel: além de menos pessoas buscarem um animal, organizações ligadas ao tema têm registrado elevado aumento nos casos de abandono.
De acordo com levantamento da Ampara Animal, uma associação de mulheres que auxilia abrigos e protetores independentes dos bichos, este triste índice cresceu 61,6% entre julho de 2020 e fevereiro deste ano. A pesquisa consolida informações de 92 abrigos, a maioria do estado de São Paulo.
“Muitas pessoas que não tinham um perfil de adotante procuraram por impulso. As ONGs relataram que, nas entrevistas, as pessoas achavam que estavam pegando um ‘brinquedinho’ para as crianças que ficaram dentro de casa. Então teve gente que devolveu o animal para os protetores ou abandonou mesmo. Há uma óbvia falta de responsabilidade”, comentou Rosângela Gebara, gerente de projetos do grupo.
A realidade também faz parte do dia a dia da Uipa (União Internacional Protetora dos Animais). Nos primeiros meses da pandemia, entre maio e julho, a ONG observou uma procura 400% superior à média de antes da chegada do vírus – o Brasil identificou a primeira infecção no final de fevereiro de 2020.
Contudo, o prolongamento da crise sanitária, além de seus impactos no orçamento familiar, fez com que o movimento tomasse um outro caminho.
“Hoje em dia vemos uma demanda por adoção cair pela metade do que era antes do coronavírus. Acredito que isso se deva a toda essa insegurança, esse período de incertezas econômicas. Por aqui, o telefone toca o tempo inteiro com pessoas querendo se desfazer do próprio animal e a procura por adoção está realmente muito baixa”, revelou Vanice Teixeira Orlandi, presidente há 16 anos da ONG fundada em 1895 e que foi uma das pioneiras do movimento de proteção animal no país. Sediada na zona norte de São Paulo, abriga cerca de 600 bichos, entre cães e gatos.
Vanice aponta também a falta de preparo das pessoas que adotam e, posteriormente abandonam: “Muitas vezes elas não estabelecem um vínculo com o animal, como deveria ser, e no primeiro momento de dificuldade, logo pensam em se desfazer do animal.”
Os números da Cosap (Coordenadoria de Saúde e Proteção ao Animal Doméstico), órgão ligado à Secretaria Municipal de Saúde, confirmam o problema. Ao Metro Jornal, o órgão informou que, até março deste ano, o município concretizou apenas 66 das adoções de cães e gatos – praticamente metade do registrado no mesmo período do ano passado, com 108 casos.
É importante ressaltar que abandonar ou maltratar animais é crime previsto pela Lei Federal número 9.605/98. Uma nova legislação, a 14.064/20, sancionada em setembro de 2020, aumentou a pena de detenção que era de até um para até cinco anos, com multa e perda da guarda. O rito processual agora é na vara criminal e não mais no juizado especial.