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Deputado da AfD é condenado por uso de slogan nazista

Um dos políticos mais incendiários da Alemanha, Björn Höcke havia proferido em público o antigo lema de uma organização paramilitar nazista. Ele foi condenado ao pagamento de uma multa de 13 mil euros.

Por Deutsche Welle

Um dos principais líderes do partido ultradireitista Alternativa para a Alemanha (AfD) no leste do país foi condenado nesta terça-feira (14/05) pelo Tribunal Distrital de Halle pelo crime de "uso público de um símbolo de uma antiga organização nacional-socialista". A corte definiu como pena o pagamento de uma multa de 13 mil euros (R$ 72 mil). Ele ainda poderá recorrer da decisão.

Björn Höcke, deputado estadual e líder da AfD no estado da Turíngia, era acusado de proferir a frase "Alles für Deutschland" ("Tudo pela Alemanha") em um discurso para cerca de 250 apoiadores em um evento de campanha em maio de 2021 em Merseburg, no estado da Saxônia-Anhalt.

O slogan usado era o mesmo que serviu de lema da organização paramilitar nazista Sturmabteilung (Tropas de assalto), conhecida pela sigla SA, cujos membros eram também chamados de "camisas-pardas". Eles se notabilizaram por atos de violência e terrorismo – especialmente contra comunistas e judeus – nas ruas da Alemanha durante a República de Weimar, o curto período democrático que precedeu a ditadura de Adolf Hitler.

Com a queda do autoproclamado Terceiro Reich em 1945, a SA, assim como todas as outras organizações nazistas ou nacional-socialistas, foi banida. Mais tarde, na recém-fundada República Federal da Alemanha (antiga Alemanha Ocidental), toda a propaganda que seguia a ideologia nacional-socialista ou de suas organizações foi proibida. Isso valeu inclusive para o slogan "Tudo pela Alemanha".

E o evento em Merseburg em 2021 não foi a única ocasião na qual Höcke agitou uma multidão com o slogan proibido.

Em 2023, quando já havia sido oficialmente indiciado pelo episódio, ele voltou a incitar apoiadores com o slogan, desta vez fazendo uso de um jogo de palavras. Nessa ocasião, em um evento num restaurante em Gera, na Turíngia, Höcke se referiu com escárnio à acusação. "Porque uma vez encerrei uma campanha eleitoral com uma tríade retórica: 'Tudo pela nossa pátria! Tudo pela Saxônia-Anhalt! Tudo pela...". Na sequência, gesticulando, Höcke incentivou seu público a completar o slogan: "...Alemanha!", gritaram os apoiadores de Höcke. O político permaneceu no palco rindo e exibindo uma expressão alegre.

Julgamento

O julgamento de Höcke teve início em abril. Durante os procedimentos, o político rejeitou as acusações na Justiça. No segundo dia do julgamento, ele afirmou ser “completamente inocente”.

Höcke argumentou que se ele soubesse de que se tratava o slogan da SA, "certamente não o teria usado". O que estava em disputa no tribunal não era o fato se Höcke havia usado o slogan, mas se ele conhecia o seu significado quando resolveu usá-lo.

Em princípio, a acusação enfrentada por Höcke poderia resultar em penalidades como uma multa ou até três anos de prisão. Caso ele fosse condenado a uma pena de prisão a partir de seis meses, o tribunal poderia, como efeito colateral, também declarar a inegibilidade do político e barrá-lo de ocupar cargos públicos.No último dia de julgamento, o Ministério Público pediu uma pena de seis meses de prisão em liberdade condicional e um multa de 10 mil euros (R$ 55 mil).

Sem uma pena efetiva de prisão, Höcke está livre para concorrer à reeleição como deputado pelo seu partido nas eleições estaduais na Turíngia, marcadas para setembro.

Notoriedade

Ex-professor de história, Höcke estudou e lecionou a matéria por muitos anos antes de entrar para a política pela AfD e se tornar um de seus representantes mais conhecidos e radicais.

Nos últimos anos, ele ganhou notoriedade com a intensidade e frequência com a qual costuma se referir direta ou indiretamente à era nazista. Em público, ele já usou outras expressões comumente associadas ao nazismo, como "degeneração" e Lebensraum (espaço vital).

Em 2017, ele chamou a atenção nacionalmente na Alemanha quando criticou publicamente o Memorial aos Judeus Assassinados da Europa, em Berlim, que relembra a matança de seis milhões de judeus europeus pelos nacional-socialistas. Na ocasião, ele provocou condenação generalizada na Alemanha ao se referir ao memorial como um "monumento da vergonha".

Em 2016, num comício da AfD, Höcke também expressou simpatia pela notória negacionista do Holocausto Ursula Haverbeck, apelidada de "vovó nazista" pela mídia alemã, que já foi condenada à prisão em diversas ocasiões por espalhar mentiras sobre o genocídio contra os judeus. Na ocasião, Höcke disse que ela estava sendo perseguida pelo que chamou de um "crime de opinião".

Obsessão pelo nazismo

Em 2017, no mesmo discurso em que atacou o Memorial do Holocausto de Berlim, Höcke criticou a maneira como os alemães lidam com a herança da ditadura nazista. Na ocasião, quando falava para a ala jovem da AfD, a Junge Alternative, ele classificou isso de uma "política de enfrentamento estúpida" que "paralisa" a Alemanha. Na sequência, disse: "Precisamos de uma virada de 180 graus na política de memória".

A fala sobre o memorial chegou a render a abertura de um processo de expulsão contra Höcke na AfD, mas no final a direção do partido decidiu mantê-lo como membro. Em vez de uma expulsão, o que aconteceu desde então é que o partido como um todo se radicalizou na direção de Höcke.

Höcke publicou seus pensamentos em um livro em 2018. Nele, ele argumenta que é errado que "Hitler seja retratado como absolutamente maligno" e que diz que a questão não pode ser vista de uma ótica em "preto e branco".

O livro está repleto de outras declarações radicais. Höcke diz que um novo líder é necessário, que a Alemanha está ameaçada "nacionalmente de morte por meio da substituição da população" – reverberando uma das principais teorias conspiratórias da extrema direita internacional. E ainda pareceu mandar um recado ameaçador para os alemães que não abraçam essas ideias: "Membros gangrenosos não podem ser curados com água de lavanda, como Hegel já sabia".

Em 2019, Höcke abandonou uma entrevista televisiva ao se irritar quando um jornalista mostrou um vídeo que citava uma frase sua. As imagens mostravam um repórter perguntando a alguns membros da própria AfD: "quem disse isso? Höcke ou Hitler em Mein Kampf?". A maior parte dos membros da AfD entrevistados evitou responder, mas um disse acreditar que a frase havia sido dita por Hitler. A frase em questão era: "Quando o ponto de virada for alcançado, nós, alemães, não faremos as coisas pela metade, vamos descartar o entulho da modernidade".

"Höcke é um fascista"

As afirmações do livro de Höcke foram consideradas tão radicais que uma corte alemã as usou como base para sua decisão de que a afirmação "Höcke é um fascista" não é caluniosa, mas se baseia em uma base factual verificável. A decisão foi tomada pelo Tribunal Administrativo de Meiningen, em 26 de setembro de 2019.

Toda essa notoriedade de Höcke, tanto na mídia alemã quanto em debates sobre a AfD, é ainda mais chamativa porque o ultradireitista não ocupa nenhum cargo político de nível nacional e nunca ocupou um. Ele nem mesmo faz parte do diretório nacional da AfD.

No entanto, Höcke, mesmo sendo um mero deputado estadual, passou a ser um tema constante na política alemã, com muitos no país debatendo seus pensamentos, visão de mundo e ações políticas.

Ambições

Mas o motivo é claro: por causa ou apesar de seu radicalismo, Höcke ajudou a dar destaque para a AfD em seu estado, a Turíngia. No momento, o partido lidera as pesquisas eleitorais nesse estado do leste alemão, que vai ser palco de uma eleição em setembro deste ano. Pesquisas mostram a legenda com cerca de 30% de apoio entre o eleitorado do estado, acima de partidos tradicionais e bem acima da média nacional, cujas pesquisas sugerem que o partido conta com entre 17% e 19% do eleitorado em todo o país.

Höcke não esconde sua ambição de se tornar governador da Turíngia, o que tem levantando temores no país de que, pela primeira vez desde 1945, um estado alemão possa ser governado por um "fascista".

O diretório da AfD na Turíngia está desde março de 2022 sob a vigilância do Departamento de Proteção à Constituição da Alemanha (BfV), a agência de inteligência interna do país. O tribunal que aprovou a medida concluiu que existiam indícios suficientes de aspirações anticonstitucionais dentro do diretório estadual, que passou a ser classificado como como uma organização "confirmada como extremista de direita".

Nesta semana, a Justiça alemã também validou uma decisão do BfV de classificar a AfD nacional como "suspeita de extremismo de direita" — permitindo, assim, que o órgão continue monitorando de perto as atividades da sigla.

Tentáculos internacionais

Fundada em 2013, inicialmente como uma sigla eurocética de tendência mais liberal, a AfD rapidamente passou a pender para a ultradireita, especialmente após a crise dos refugiados de 2015-2016, com seus antigos membros liberais sendo suplantados por figuras mais reacionárias. Hoje, são especialmente políticos como Höcke que dão o tom da legenda. O partido também tem conexões com a extrema direita mundial. Em 2021, uma de suas deputadas, Beatrix von Storch, foi recebida pelo então presidente brasileiro Jair Bolsonaro.

Em abril, ao mesmo tempo em que publicava críticas ao ministro brasileiro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, o empresário Elon Musk usou sua conta na rede X para trocar publicamente mensagens com ninguém menos do que Björn Höcke.

Respondendo a uma mensagem na qual o alemão – expressando-se em inglês, algo incomum para Höcke – queixava-se do seu processo criminal, Musk perguntou "o que você disse?". Outro usuário respondeu então a Musk que Höcke havia dito "Tudo pela Alemanha". Musk então questionou "Por que isso é ilegal?".

Aproveitando o peso da conta de Musk, que conta com 181 milhões de seguidores, Höcke respondeu, novamente em inglês: "Porque todo patriota na Alemanha é difamado como nazista".

jps/bl (ots)

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