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Hoje não sei se usaria hidroxicloroquina, diz virologista que aconselhou Bolsonaro

Paolo Zanotto lembrou contato com Arthur Weintraub e diz que se afastou do governo

Da Redação, com Rádio Bandeirantes

O virologista Paolo Zanotto afirmou nesta terça-feira (15), em entrevista à Rádio Bandeirantes, que participou de orientações à Presidência da República contra a pandemia do novo coronavírus após ser procurado por Arthur Weintraub, então assessor da Presidência.

Segundo Zanotto, Weintraub entrou em contato com ele no começo de 2020, sem especificar datas. Posteriormente, ambos participaram de uma reunião com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em Brasília, na qual Zanotto questionou o uso de vacinas contra a Covid-19 e defendeu o uso da hidroxicloroquina no combate à doença.

“No começo do ano passado, eu tinha sido procurado pelo consultor de ciência do presidente, Arthur Weintraub. Ele tem um doutorado em Direito, depois ele fez um pós-doutorado em Neurociências. É interessante, porque quando ele me ligou, achei até estranho, ele sabia do que estava falando, vamos dizer assim”, afirmou o médico.

Zanotto explicou que o ponto de vista defendido na reunião da época não é o mesmo de hoje em dia, já que os estudos a respeito de vacinas avançaram desde então.

“Hoje, (estou convencido) sim (da importância da vacina). Mas coloca mais ou menos em agosto do ano passado, quando a gente não sabia o que estava acontecendo com essas vacinas, o histórico”, afirmou.

“Essa foi uma conversa datada de agosto do ano passado. Em agosto do ano passado, a gente tinha a seguinte situação: os dados pré-clínicos de vacinas, em face do que já tinha acontecido com Mers e Sars-Cov-1 (respectivamente, Síndrome Respiratória do Oriente Médio e Síndrome Respiratória Aguda Grave, causadas por outros tipos de coronavírus), não estavam disponibilizados. Governos no mundo inteiro estavam fazendo negociações com grandes empresas que estavam vendendo vacinas. Na época, o que existia eram os dados dos trabalhos em Marselha, Nova York, Detroit, e os estudos observacionais feitos no começo do ano na China, que mostravam que existia uma redução de risco com o uso da cloroquina. Não tinha nenhum dado desses sobre vacina”, acrescentou.

O médico, porém, admitiu que talvez não usasse mais o remédio atualmente em pacientes que estão sendo vacinados. A defesa, de acordo com o virologista, era feita na época com base em informações colhidas junto a pesquisadores de Senegal, China e França a partir da virada de 2019.

“Hoje, eu não sei se usaria mais a hidroxicloroquina. Como ela é uma molécula cuja função é inibir a resposta autoimune, não acho uma boa ideia usar no contexto de vacinação. Na época, não tinha vacina. O problema da hidroxicloroquina no dia de hoje é que ela vai poder interferir na produção de anticorpos da pessoa vacinada. Então, não é uma boa ideia usar mais. Mas a gente tem que colocar as coisas no contexto.”

Apesar do ponto de vista, o virologista fez ressalvas a determinadas vacinas e deixou claro que não acredita que todas sejam de fato eficazes e seguras.

“Isso vai depender muito da plataforma vacinal”, argumentou. “Qual é a vacina segura? Aquela que não vai usar (proteína) spike inteira”, completou.

Segundo Zanotto, as mais recomendadas nesse critério são as fabricadas por Pfizer e CanSino Biologics, ambas aplicadas com dose única. A Anvisa recebeu em maio o pedido de uso emergencial da vacina da CanSino.

O virologista ainda afirmou que se afastou de conversas com a presidência da República, uma vez que as propostas apresentadas por ele teriam sido ignoradas – ou, nas próprias palavras, “é como você falar com alguém que não escuta”.

“A função do técnico é avisar o gestor as consequências. O gestor vai tomar a decisão. A proposta para o governo era montar esse grupo dos melhores cientistas do Brasil. Eles não fizeram. Acho que isso explica muito. No meu caso, nada do que eu propus foi ouvido ou levado a sério. Eu não posso ir além disso, porque não sei quais são as motivações, as ideias. Mas eu certamente, depois disso, eu me afastei”, explicou.

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