Áreas de pesca sufocadas por jacintos-de-água. Ovos de aves nativas devorados por ratos. Tubulações de usinas elétricas entupidas por mexilhões-zebra. Fios de eletricidade derrubados por cobras marrons.
Esses são alguns exemplos dos problemas causados por espécies invasoras, cuja disseminação em todo o mundo tem custo econômico anual de pelo menos 423 bilhões de dólares (R$ 2 trilhões), cifra que quadruplicou a cada década desde 1970, informaram pesquisadores nesta segunda-feira (04/09).
Uma equipe de 86 especialistas de 49 países analisou durante quatro anos os impactos globais de cerca de 3.500 espécies invasoras prejudiciais. O relatório estima que essas espécies desempenham um papel central em 60% das extinções registradas de plantas e animais.
Apesar de algumas espécies terem sido introduzidas em outros ambientes de propósito, com o objetivo de produzirem efeitos benéficos para os humanos, o relatório conclui que muitas têm impactos negativos expressivos para a natureza e para os próprios humanos. "Esse é um problema que ficará muito, muito pior", disse a ecologista Helen Roy, copresidente da Plataforma Intergovernamental de Políticas Científicas sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos da ONU (IPBES).
O que são espécies invasoras?
Espécies invasoras são plantas ou animais, geralmente deslocados pela atividade humana, que se instalam em um ambiente e provocam efeitos negativos, como a morte da vida selvagem nativa, danos à infraestrutura e ameaças à saúde e aos meios de subsistência humanos, em especial para comunidades tradicionais e povos indígenas.
Os impactos geralmente demoram a se materializar, mas podem ser catastróficos. Os incêndios florestais devastadores no Havaí em agosto foram potencializados por gramíneas invasoras inflamáveis trazidas da África como pasto para o gado.
No Brasil, há preocupação crescente com o peixe-leão, originário do Indo-Pacífico e que vem se alastrando pela costa brasileira, colocando em risco 29 espécies de peixes nativos brasileiros.
Espécies invasoras de mosquitos também podem disseminar doenças como dengue, malária e zika. Em agosto, as autoridades de saúde de Paris fumigaram áreas da capital francesa pela primeira vez para tentar conter a proliferação do Aedes albopictus, o mosquito-tigre-asiático.
"As espécies invasoras estão afetando não apenas a natureza, mas também as pessoas e causando grande perda de vidas", disse o copresidente do relatório, Anibal Pauchard, do Instituto de Ecologia e Biodiversidade do Chile.
Erradicação é difícil, mas possível
Cerca de três quartos dos impactos negativos causados por espécies invasoras ocorrem em terra, especialmente em florestas, bosques e áreas cultivadas.
Embora os invasores possam se apresentar de várias formas, incluindo micróbios, invertebrados e plantas, os animais geralmente causam o maior impacto ambiental, especialmente os predadores, disse Roy.
Nas ilhas, muitas espécies evoluíram sem predadores e, portanto, têm poucas defesas e são "muito ingênuas", afirmou Pauchard. "Os pássaros da Nova Zelândia não tinham experiência com ratos até que os humanos chegaram e trouxeram os ratos. Seus ninhos ficam no nível do solo."
É difícil se livrar de espécies invasoras depois que elas se estabelecem. Algumas ilhas da Polinésia Francesa tiveram sucesso na erradicação de ratos e coelhos invasores com armadilhas e envenenamentos. Mas populações maiores que se reproduzem rapidamente podem ser complexas de lidar. E plantas invasoras geralmente deixam suas sementes dormentes no solo por anos.
Segundo os cientistas, as medidas de prevenção por meio de biossegurança nas fronteiras e controles de importação são as mais eficazes. Um exemplo de sucesso é a redução da ocorrência do percevejo-fedorento na Oceania. "Uma das mensagens mais importantes do relatório é que é possível obter progressos ambiciosos ao lidar com espécies invasoras", disse o professor Peter Stoett, do Canadá.
Em dezembro passado, governos de diversos países do mundo comprometeram-se a reduzir a introdução e o estabelecimento de espécies invasoras prioritárias em pelo menos 50% até 2030, ao assinarem o Marco Global para a Diversidade.
Segundo o relatório apresentado nesta segunda-feira, 80% dos países têm metas relacionadas ao gerenciamento de espécies invasoras, mas apenas 17% têm leis ou normas específicas para lidar com o tema. Além disso, 45% dos países não destinam recursos para o gerenciamento de espécies invasoras.
bl (Reuters, AFP, ots)