Onze dias após a cidade de Maceió, capital do Alagoas, registrar os primeiros tremores de terra e a Defesa Civil ordenar a evacuação de áreas inteiras no perímetro de uma mina de sal-gema da Braskem que corria risco iminente de colapsar, o órgão confirmou neste domingo (10/12) o rompimento de parte da estrutura.
Técnicos da Defesa Civil de Maceió continuam em alerta e monitoram a área, avaliando os danos ambientais na lagoa Mundaú, no bairro do Mutangue. A preocupação é que haja salinização da lagoa, o que pode ter impactos sobre organismos vivos na região. O trecho que colapsou fica sobre a lagoa, e o órgão alertou a população, que já tinha sido evacuada, para ficar longe do local.
De acordo com os técnicos, o desabamento do teto da mina deve fazer com que fique mais lento o afundamento do solo, já que a cavidade deve ser preenchida com roca e água da lagoa.
Nas imagens divulgadas pelo perfil do prefeito João Henrique Caldas (PL) no X (ex-Twitter), é possível ver a água borbulhar em um ponto na margem da laguna; em outra imagem, o perímetro de movimentação na lagoa está maior e a água parece ser tragada com violência junto com parte da vegetação.
Segundo a administração municipal, porém, a mina 18 e todo o entorno dela estão desocupados e não há riscos para a população.
A Defesa Civil decretou alerta máximo para a mina em 30 de novembro, após tremores terem sido registrados na região, dado o risco de colapso da mina a qualquer momento, gerando uma possível cratera de 300 metros de diâmetro – mais de dez vezes o raio da mina.
Desde então, a área afundou 2,35 metros.
Ainda não se sabe o diâmetro do buraco aberto pelo desabamento de parte da mina, nem as consequências ambientais do desastre.
Ao portal de notícias UOL, a professora da Universidade Federal de Alagoas (UFAL) e engenheira geóloga Regla Toujaguez afirmou que o rompimento registrado no início da tarde deste domingo não significa o colapso da mina, mas sim o começo do processo.
"Para que o colapso aconteça de fato toda a circunferência deve ceder, algo que ainda não aconteceu, mas agora é preciso ficar em alerta", afirmou Toujaguez.
Coordenador da Defesa Civil de Maceió, Abelardo Nobre, descartou o risco de novos rompimentos na área e disse ao portal de notícias g1 que o afundamento "agora vai entrar em um ritmo de desaceleração".
"O que aconteceu já estava dentro da área de previsão. Foi algo isolado e as outras áreas que estão sendo monitoradas por sensores não apresentaram nenhuma alteração. Pela imagens, foi uma medição pequena", disse Nobre.
Quando a Defesa Civil emitiu o primeiro alerta, onze dias antes do colapso, os moradores foram obrigados a deixar suas casas às pressas – mesmo que sob força policial. À época, eles queixaram-se de terem sido informados em cima da hora e da falta de clareza sobre quais serão os próximos passos e se serão indenizados pela Braskem.
Um hospital no bairro Pinheiro, vizinho ao Mutange, também foi evacuado como precaução.
A cidade está em situação de emergência, com reconhecimento do governo federal, e deve, por isso, ter acesso simplificado a verbas federais.
Como o problema começou
O risco apresentado pelas minas de sal-gema em Maceió já é conhecido há vários anos.
O minério, utilizado para a produção de soda cáustica e PVC, começou a ser extraído da região no final da década de 1970, pela então Salgema Indústrias Químicas S/A, em minas localizadas a cerca de 1.200 metros abaixo da superfície.
Para retirar o minério, a empresa injetava água na camada de sal e extraía a salmoura resultante. Depois, reinjetava líquidos no local para estabilizar o solo. Porém, as minas apresentaram vazamentos.
Em 2018, grandes rachaduras começaram a aparecer no bairro do Pinheiro e tremores de terra foram registrados. No ano seguinte, um órgão do governo federal, o Serviço Geológico do Brasil, confirmou que as minas de sal-gema estavam provocando a instabilidade.
Há, no total, 35 minas na capital alagoana, que foram desativadas em 2019.
Desde junho de 2019, mais de 14 mil imóveis de cinco bairros de Maceió tiveram que ser desocupados devido à instabilidade do solo, criando ruas fantasmas onde antes moravam 55 mil pessoas.
A Braskem vem realizando intervenções para tentar estabilizar as cavernas criadas para extração do minério, mas, em novembro, cinco tremores de terra foram registrados na região.
Como a Braskem se posiciona
Depois de os tremores voltarem a ocorrer em 30 de novembro, a Braskem afirmou em nota que reconhece o crescente risco no local e disse estar tomando todas as medidas cabíveis para reduzir seu impacto, e que segue monitorando e compartilhando os dados com as autoridades, com quem afirma colaborar.
A empresa vem indenizando os moradores obrigados a se realocar, nos termos de um acordo assinado em janeiro de 2020 com Ministério Público Federal, Ministério Público do Estado de Alagoas, Defensoria Pública da União e Defensoria Pública do Estado de Alagoas.
Segundo a Braskem, em outubro, 17.828 indenizações já haviam sido pagas, e o montante desembolsado em indenizações e auxílios financeiros somava R$ 3,85 bilhões.
Devido à crise em Maceió, a Braskem cancelou sua participação na Conferência do Clima, COP28, em Dubai. Representantes da empresa participariam de ao menos dois painéis da cúpula.
"Nos últimos dias, diante do agravamento da crise de Maceió, [a Braskem] achou melhor cancelar sua participação em alguns painéis para evitar que o assunto sobrepujasse quaisquer outras discussões técnicas, dificultando eventuais contribuições que a empresa pudesse oferecer", afirmou a empresa em nota.
Empresa multada
O Instituto do Meio Ambiente do Estado de Alagoas (IMA-AL) decidiu multar a Braskem em mais de R$ 72 milhões por omissão de informações, danos ambientais e pelo risco de colapso e desabamento da mina 18. A entidade afirma que desde 2018 já autuou a empresa em 20 ocasiões.
A primeira multa, no valor de R$ 70.274.316,34, diz respeito à degradação ambiental decorrente de atividades que, direta ou indiretamente, afetam a segurança e o bem-estar da população e geram condições desfavoráveis para as atividades sociais e econômicas.
O IMA caracterizou a nova ocorrência de colapso da mina como reincidência, uma vez que um estudo anterior realizado pela entidade já havia constatado dano ambiental na região da mina 18.
"Além dessa autuação, a Braskem vai responder também pela omissão de informações sobre a obstrução da cavidade da mina 18, detectada no dia 7 de novembro de 2023, quando a empresa realizou o exame de sonar prévio para o início do seu preenchimento", informou o instituto.
A realização do exame de sonar estava em desconformidade com a licença de operação da empresa, o que resultou na aplicação de uma multa de R$ 2.027.143,92.
bl/le/ra/cn/rc/rk (Agência Brasil, ots)