Em maio, eu e outros nove estudantes da escola Francisca Rocha Silva, localizada no município de Jaguaruana, no Ceará, nos mobilizamos para realizar um projeto intitulado "Compreendendo o autismo: Educação e sensibilização para inclusão". Lutamos para desconstruir estereótipos infelizmente enraizados na sociedade em relação ao autismo.
Fomos incentivados pelo colégio por meio da décima feira de ciências, na qual tivemos que escolher uma problemática para pesquisa. Ao debater em equipe para decidir o tema, lembro de ter sugerido abordarmos o Transtorno do Espectro Autista (TEA), pois é um assunto de suma importância que está, lastimavelmente, repleto de preconceitos e limitado à visão errônea de indivíduos com mentalidade míope ou sem acesso ao conhecimento correto. Além disso, é uma temática que desperta profundamente meu interesse, tanto por gostar de estudar sobre a mente, quanto, principalmente, por ter casos de autismo na família.
De início, pensamos em estratégias de como a tecnologia poderia ajudar na aprendizagem de pessoas com autismo. No entanto, ao observar o perfil dos estudantes autistas de nossa escola, percebemos que as necessidades são outras, uma vez que possuem rendimento escolar elevado e facilidade no aprendizado. Sim, com dificuldades em algumas matérias como qualquer outro aluno e não necessariamente por causa do autismo.
A necessidade notada foi a questão da interação social, sendo pouca para alguns, enquanto outros já conseguem se comunicar de forma assertiva no seu próprio ritmo, cada um com suas peculiaridades. Por isso, o termo espectro, devido à ampla variedade de habilidades e dificuldades que juntas caracterizam o TEA. O autismo não é único e nem estático, as pessoas dentro do espectro também são diversas, particulares e aprendem e se desenvolvem todos os dias. Com isso, realizamos ações para ajudar a promover a inclusão de autistas na comunidade escolar e na sociedade.
Visitamos o Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) de nossa cidade para conhecer um projeto incrível chamado "Os amigos da inclusão", que contempla 30 crianças e adolescentes com TEA. Solicitamos que a equipe viesse à nossa escola realizar uma palestra para todas as turmas sobre o autismo, em conjunto com uma nutricionista para falar sobre a seletividade alimentar.
Ouvindo a voz de autistas
Quando falamos em ampliar o conhecimento sobre o TEA para promover a inclusão, é fundamental, antes de tudo, ouvirmos a voz de autistas, conhecer suas opiniões, habilidades, desafios e experiências. Temos muito a aprender com eles. É um aprendizado que vem de dentro para fora, não ao contrário, pois obtemos uma compreensão mais autêntica do que significa ter autismo ao receber informações sobre suas necessidades, dificuldades e pontos fortes. Isso ajuda a aumentar a conscientização e a compreensão do autismo.
Foi o que buscamos fazer em cada ação do nosso projeto. Conversamos diretamente com eles e pedimos feedbacks. Convidamos um estudante para gravar um vídeo falando um pouco de sua vivência como autista na escola e na sociedade em geral, ressaltando a importância de se compreender o autismo para promover a inclusão. Esse vídeo postamos no perfil do Instagram que criamos, "compreendendoautismo", com o objetivo de compartilhar informações claras sobre o TEA com um maior número de pessoas.
Reconhecendo a importância do protagonismo de autistas no processo de inclusão, elaboramos um questionário para ser respondido por estudantes de nossa escola, contendo 16 perguntas sobre sua vida social, familiar e estudantil. A análise dos dados coletados possibilitou entender suas perspectivas, preferências e necessidades.
Uma das perguntas era sobre o que gostariam que a escola fizesse para que eles se sentissem mais confortáveis no ambiente escolar, e a resposta foi: "Não sei se seria viável, mas eu adoraria um ambiente para passar o meu intervalo. Imagino que não só eu, mas outras pessoas também sintam falta de um ambiente controlado e silencioso, onde as pessoas possam ir para 'recalibrar' os sentidos e se manter em silêncio por um tempo, para poder voltar 100% para as aulas", disse o estudante José Luís.
Espaço de tranquilidade
Conversamos com a gestão da nossa escola e solicitamos um espaço destinado a essa causa. Descobrimos que a escola já tinha essa ideia, porém estava apenas no papel e não havia sido concretizada. Então, lutamos para torná-la realidade e assim fizemos. A escola nos concedeu uma salinha que limpamos e decoramos para ser esse espaço tranquilizador. Uma sala silenciosa oferece um local tranquilo onde esses estudantes podem se acalmar, reduzir o estresse, a ansiedade e regular suas sensações sensoriais. Ter acesso a ela pode ajudar os estudantes autistas a se sentirem mais confortáveis e seguros na escola. Isso, por sua vez, pode melhorar seu bem-estar emocional, concentração nas aulas e disposição para aprender.
A escola, ao incentivar a pesquisa e encorajar o protagonismo dos estudantes no aprendizado, contribui para o desenvolvimento do senso crítico e para a formação de cidadãos ativos. Além disso, ajuda a terem um melhor desempenho na universidade.
É importante também que estudantes tenham essa sensibilização de enxergar os problemas e desafios de sua escola como uma oportunidade de fazer a diferença. Desde o início do projeto, agarrei essa causa com garra e lutei fortemente para que tudo desse certo. Todas as palavras seriam insuficientes para explicar o que sinto. Minha parte faço com ações e espero que nosso projeto possa fazer realmente a diferença na vida de alguém. Tem uma frase de Madre Teresa de Calcutá que sempre me marcou muito e é perfeita para expressar meus sentimentos: "Sei que meu trabalho é uma gota no oceano, mas sem ele, o oceano seria menor".
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Vozes da Educação é uma coluna semanal escrita por jovens do Salvaguarda, programa social de voluntários que auxiliam alunos da rede pública do Brasil a entrar na universidade. Revezam-se na autoria dos textos o fundador do programa, Vinícius De Andrade, e alunos auxiliados pelo Salvaguarda em todos os estados da federação. Siga o perfil do programa no Instagram em @salvaguarda1
Este texto, escrito por Amanda Bessa Pascoal, de 18 anos, estudante do 3° ano do Ensino Médio de um colégio público em Jaguaruana (CE), reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW.
Autor: Amanda Bessa Pascoal