Justiça mantém prisão de médico acusado de manter paciente em cárcere privado

Bolívar Guerrero Silva é equatoriano e foi preso no hospital

Felipe de Moura*

O Tribunal de Justiça do Rio decidiu manter a prisão temporária do médico equatoriano Bolívar Guerrero Silva, de 63 anos, acusado de manter uma paciente em cárcere privado no Hospital Santa Branca, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, do qual Bolívar é sócio.

A juíza Daniele Lima Pires Barbosa tomou a decisão na tarde desta terça-feira (19) na audiência de custódia. Durante a sessão, a defesa de Bolívar pediu a revogação da prisão e o Ministério Público foi a favor da manutenção da medida cautelar.

Segundo a juíza, “cumpre consignar que nenhuma forma de agressão física no ato prisional foi relatada pelo custodiado. No caso em tela, o custodiado foi preso em virtude de cumprimento de mandado de prisão temporária expedido pela 3ª. Vara Criminal de Duque de Caxias. O mandado de prisão está dentro do prazo de validade e a decisão que gerou sua expedição não foi revogada pelo juízo natural, não se tendo notícias de que tenha sido alterada por decisão recursal”.

Além do médico e de funcionários do hospital, sete pacientes operadas pelo equatoriano também prestaram depoimento nesta terça-feira (19) na delegacia de atendimento à mulher de Duque de Caxias. Elas o acusaram de erros médicos e negligência.

“Dia 14 de janeiro de 2021 eu realizei uma cirurgia de prótese na mama e a cirurgia ficou horrorosa. No dia 2 de agosto eu fiz o reparo. Na segunda cirurgia eu fui tratada igual um lixo até pela equipe médica completa. Quando eu saí do centro cirúrgico, meus seios já saíram deformados, com a cicatriz da minha auréola toda torta e meu peito estava um em cima e outro embaixo. Dá para ver o defeito nitidamente”, disse uma possível vítima do médico Bolívar. Ela não quis se identificar.

RELEMBRE O CASO

Bolívar foi preso nesta segunda-feira (18) suspeito de manter uma paciente em cárcere privado por dois meses, dentro do hospital, depois dela fazer duas cirurgias plásticas com ele. Os procedimentos teriam dado errado, o que levou o homem a tentar ocultar o real estado de saúde dela.

A mulher de 36 anos passou por uma cirurgia no abdômen e por colocação de próteses nos seios. Pelo menos outras três intervenções tiveram que ser feitas para tentar corrigir o quadro dela.

Em uma publicação nas redes sociais, a equipe de Bolívar nega as acusações e alega que a paciente queria ser liberada antes do fim do tratamento. O objetivo dele seria prestar toda a assistência até que ela estivesse recuperada.

Segundo a delegada do caso, Fernanda Fernandes, ele é “acusado de cárcere por impedir a transferência e locomoção da mulher”, que passou por uma cirurgia plástica na unidade. Segundo a titular, “ainda não é possível estipular quantos meses a vítima ficou sob essa condição”.

De acordo com os relatos de amigos e familiares, o quadro da paciente é grave e requer cuidados. Apesar dos agentes terem solicitado o prontuário médico, o documento não foi entregue pela direção do Hospital Santa Branca no prazo estipulado.

O estado de saúde dela chocou os agentes. Segundo a delegada Fernanda Fernandes, em breve contato com os policiais, a mulher teria pedido ajuda para deixar o hospital.

No último sábado (16), a Justiça decretou a prisão temporária de Bolívar, além da suspensão do registro dele no Conselho Regional de Medicina. Além disso, na decisão, a juíza Renata Travassos Medina de Macedo, da Vara de Violência Doméstica de São João de Meriti, também determinou a expedição de mandados de condução coercitiva contra membros da direção e funcionários da unidade.

Nesta segunda (18), também foram cumpridos mandados de busca e apreensão. A vítima ainda aguarda uma transferência depois da liminar e a expectativa é que mais testemunhas do caso sejam ouvidas pela polícia em breve.  O hospital pode ser fechado depois da perícia.

Bolívar já tinha sido preso em 2010 acusado de integrar um grupo que comercializava e aplicava medicamentos sem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

“Eu tive duas paradas cardíacas, fui parar no UPA, necrosou. Cheguei no hospital, fiquei no CTI, quase morta. Eu fiquei com sequelas na minha barriga, ainda estou. Eu estou com defeito, minha barriga está toda torta, meu umbigo está todo torto. Eu tenho ataque epilético devido a isso, tenho ansiedade. Eu estou viva por um milagre. Ele (Bolívar) não pode sair impune. É injusto. Muitas mulheres estão morrendo na mão desse homem”, disse Ana Cláudia Pedrosa, mais uma suposta vítima do médico Bolívar que foi operada no Hospital Santa Branca.

O QUE DIZEM OS CITADOS
 

CREMERJ 

"Tendo conhecimento do caso pela imprensa, o Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro abriu sindicância para apurar os fatos. Todo procedimento segue em sigilo de acordo com os ritos do Código de Processo Ético-Profissional”.

HOSPITAL SANTA BRANCA

 "Hospital Santa Branca Ltda vem através de sua diretoria em atenção aos comunicados veiculados nas mídias escritas, narradas e digitais manifestar-se publicamente sobre acusações infundadas de CÁRCERE PRIVADO no interior das suas dependências. Tal crime decorre do verbo encarcerar, que significa deter, ou prender alguém indevidamente e contra sua vontade. No crime de cárcere privado, a vítima quase não tem como se locomover, sua liberdade ficarestrita a um pequeno espaço físico, como um quarto ou um banheiro. Com 43 anos de funcionamento, essa Unidade desconhece tal prática dentro do seu estabelecimento, sempre buscando zelar pela saúde física e mental de seus pacientes, prezando pelo direito de ir e vir dos mesmos, amparado por um equipe multidisciplinar profissional, centros cirúrgicos e CTI com 20 leitos operando 24 horas por dia. Nossas salas cirúrgicas são locadas. Repudiamos quaisquer práticas criminosas que nos foram indevidamente atribuídas! Tal acusação é absurda! Além disso, o Dr. Bolivar Guerrero não pertence ao quadro societário desta empresa, como descrito pela imprensa. 

- DATA DA INTERNAÇÃO DA PACIENTE 01/06/2022. 
- ACOMODAÇÃO: APARTAMENTO PRIVATIVO COM DIREITO A ACOMPANHANTE . 
- PACIENTE RECUSA-SE A SAIR DA UNIDADE, (TRANSFERIDA). 
- TODO CUSTO DA PACIENTE MANTIDO PELO CIRURGIÃO, INCLUSIVE COM ATENDIMENTOS EXTERNOS".

EQUIPE DO MÉDICO

"O dr. Bolivar foi prestar um depoimento na delegacia. Ele não estava mantendo paciente nenhuma em cárcere privado. Ela estava fazendo curativo e sendo assistida no hospital dele por ele. Porém ela queria ser liberada sem ter terminado o tratamento e ele como médico seria imprudente de liberá-la. Ele disse que poderia liberá-la se ela assinasse a alta à revelia (documento ao qual a paciente se responsabiliza por qualquer coisa que acontecer após sua liberação) e ela não quis assinar. Ele disse que liberaria somente se ela assinasse. Como ela não assinou ele não liberava. O intuito dele é prestar toda assistência a paciente até ela está recuperada".

*Estagiário sob supervisão de Natashi Franco