Saúde

Depressão perinatal: o que é e como tratar

Britney Spears contou que já sofreu do problema, que atinge 15% das mulheres grávidas no mundo

Tania Valeria Gomes

Diagnóstico precoce ajuda no tratamento da depressão perinatal Via Pixabay
Diagnóstico precoce ajuda no tratamento da depressão perinatal
Via Pixabay

Na semana passada, Britney Spears fez um post no seu perfil do Instagram para contar aos seus fãs que ela está grávida do seu terceiro filho. Ela também aproveitou a postagem para levantar a bola sobre um problema grave que acomete muitas mulheres durante a gravidez e no pós-parto: a depressão perinatal.

A depressão perinatal é uma condição que atinge 15% das mulheres grávidas no mundo, segundo Joel Rennó Jr., Diretor do Programa de Saúde Mental da Mulher do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas. No Brasil, a estimativa é que uma em cada cinco mulheres grávidas sofram com o problema.

“O período perinatal, que engloba a gravidez e o pós-parto até um ano, não é um período só de flores e de felicidade a todo custo como muitas pessoas acabam estigmatizando,” diz Rennó Jr.

Além das transformações pelas quais o corpo da mulher passa nesse período, há fatores genéticos e comportamentais que podem deixá-las mais propensas a este tipo de depressão. E a pressão para que a grávida se sinta feliz durante a gestação pode atrapalhar o diagnóstico precoce.

"Isso faz com que as mulheres tenham medo de expor seus sentimentos e suas dores. Às vezes, nos exames pré-natal, isso não tem uma avaliação adequada por parte do obstetra e pode fazer com que os quadros de depressão no pós-parto sejam muito mais graves do que seriam se existisse um acompanhamento precoce," explica Rennó Jr.

Hoje, há métodos que podem ajudar a identificar um quadro potencial de depressão perinatal. É o caso da Escala de Edimburgo, que foi desenvolvida no Reino Unido e usa um questionário rápido que, dependendo da pontuação, pode indicar um quadro de depressão. Pontuações iguais ou maiores que dez devem acender um sinal de alerta para que a mulher procure um especialista.

No entanto, a escala por si só não é o suficiente para determinar um quadro de depressão ou o quanto ele é grave. As observações de familiares e amigos próximos podem ser de grande ajuda porque eles podem perceber mudanças comportamentais que poderiam ser confundidas com a fadiga, por exemplo.

"É importante notar as alterações de humor e de comportamento que persistem por mais de duas semanas," explica Rennó Jr. Ele cita crises de choro constantes, humor deprimido, anedonia - que é a perda do prazer pelas atividades habituais -, como exemplos de comportamentos de alerta.

Foi exatamente o que aconteceu com Natalia Pedroso, 31, na primeira gravidez. Mãe de duas crianças, ela lembra que começou a passar os dias com os pais logo após o seu marido retornar ao trabalho ao fim da licença paternidade.

"Meu pai percebeu que eu não estava comendo e que minhas atitudes estavam estranhas. Eu chegava em casa e chorava. E quando eu acordava de madrugada, eu chorava também." Natalia lembra da angústia que sentiu quando se viu sozinha com sua primeira filha após este período com os pais. "No primeiro dia, quando me vi sozinha em casa, eu fiquei desesperada. Eu não sabia o que fazer."

Natalia não procurou ajuda nesta época e acredita que isso influenciou no desenvolvimento da depressão perinatal durante sua segunda gravidez.

"Quando eu engravidei a segunda vez, aí eu senti de verdade. Porque eu já estava com uma depressão pós-parto não tratada, e eu descobri um problema na tireoide. Eu não me senti feliz durante minha segunda gravidez inteira."

Um quadro depressivo em qualquer momento anterior da vida pode pré-dispor a mulher a um quadro de depressão durante a gravidez e depois do nascimento da criança. Por isso, o acompanhamento dos aspectos psicológicos são tão importantes quanto dos aspectos físicos da gestante.

É possível prevenir?

Algumas medidas podem ajudar a gestante a evitar ou atenuar os sintomas da depressão perinatal. Em primeiro lugar, é recomendado manter bons hábitos como a prática de atividades físicas e uma alimentação saudável, com uma dieta com concentrações adequadas de cálcio e ômega 3, por exemplo. Também é importante evitar a ingestão de álcool e ficar longe do cigarro.

No entanto, quadros mais graves precisam de uma indicação médica sobre um provável acompanhamento psiquiátrico e até o uso de medicamentos, o que é mal-visto por muita gente e até alguns profissionais.

"Muitos acham que os remédios psiquiátricos viciam. Tenho uma conhecida que uma vez me perguntou se eu não ficava dopada. As pessoas não entendem que você toma o remédio para ele te suprir de algo que te falta," diz Natalia.

Segundo Rennó Jr., há muita desinformação sobre o uso de medicamentos durante a gravidez e no pós-parto, e principalmente em relação ao uso durante a amamentação.

"Uma mulher com depressão pós-parto grave tem uma chance de 20% de cometer suicídio. Nestes casos, você pode receitar medicação avaliando bem todos os critérios." Segundo o especialista, hoje em dia, há antidepressivos que são seguros para uso durante a amamentação. "Temos conhecimento técnico adequado para que essa mulher fique tranquila e amamentando ao mesmo tempo que se trata."

Ele também ressalta que um quadro depressivo grave não tratado adequadamente pode levar à interrupção da amamentação pela mãe. "A amamentação para ela pode virar uma tortura," ele avalia.

Natalia concorda. "Ninguém te fala que a amamentação é uma coisa extremamente difícil,  não só para criança pegar, mas para a mãe oferecer.  É uma mistura emocional e mexe muito com você".

Para além dos cuidados com a mãe, uma depressão perinatal ignorada ou mal tratada pode ter consequências negativas também no desenvolvimento da criança, seja ao nível afetivo-emocional, social ou até mesmo cognitivo.

A busca pela ajuda médica é importante tão logo os primeiros indícios sejam percebidos. Segundo o Rennó Jr., 60% dos quadros de depressão pós-parto são oriundos de depressão não diagnosticada e não tratada durante a gravidez.

Para Natalia, cujos filhos têm hoje 7 e 10 anos, a ajuda profissional foi e ainda é muito importante. "Até hoje eu faço tratamento psiquiátrico e psicológico, e faço porque cada fase tem o seu problema, não adianta só conversar com a mãe, com a amiga, com o papagaio," brinca.

Ela aconselha todo mundo que tem condições para isso para ir em busca dessa ajuda. "Nós estamos numa situação caótica, num mundo caótico, e os profissionais estão aí para ajudar. A ajuda psicológica é essencial porque você pode se expor sem medo de ser julgada."