Saúde

Estudo: 8% dos atletas desenvolvem sintomas persistentes após a Covid

Karina Toledo, da Agência FAPESP

Constatação foi feita por pesquisadores da USP com base na revisão de 43 artigos
Constatação foi feita por pesquisadores da USP com base na revisão de 43 artigos
Pexels/Pixabay

Após analisar 43 artigos científicos que descrevem os impactos da COVID-19 em atletas, pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) concluíram que, embora a doença seja assintomática ou leve na grande maioria dos casos (94%), algo em torno de 8% dessa população desenvolve sintomas persistentes, que podem afetar o desempenho e até mesmo retardar o retorno aos treinos e competições.

Ao todo, foram analisados dados de 11.500 atletas, incluindo amadores e profissionais de alto rendimento. O trabalho contou com financiamento da FAPESP (projetos 17/13552-2, 19/05616-6, 19/14819-8 e 20/04877-8) e os resultados foram divulgados sexta-feira (27/05) no British Journal of Sports Medicine.

“Estudamos tanto o quadro agudo da doença, buscando avaliar as manifestações e a gravidade, como também os sintomas persistentes, registrados depois que o vírus já havia sido eliminado do organismo. É algo um pouco mais abrangente do que aquilo que se convencionou chamar de COVID longa”, explica Bruno Gualano, professor da Faculdade de Medicina (FM-USP) e coordenador da investigação. “Trata-se de um verdadeiro compêndio sobre o tema, que pode orientar profissionais de saúde que trabalham com essa população.”

De acordo com o artigo, 74% dos atletas apresentaram sintomas na fase aguda, sendo os mais comuns anosmia/ageusia (46,8%), febre/calafrio (38,6%), dor de cabeça (38,3%), fadiga (37,5%) e tosse (28%). Somente 1,3% evoluiu para a forma grave da doença.

Gualano ressalta que o índice de casos graves é semelhante ao observado na média da população. Já o percentual de casos assintomáticos é mais difícil de ser comparado. “Muitos infectados com sintomas leves passam despercebidos na população em geral. Já entre os atletas, que passam por avaliações frequentes, esses casos tendem a ser mais diagnosticados”, diz.

Na avaliação do pesquisador, os achados mais inovadores da pesquisa se referem ao que ocorre após a fase aguda. Entre 3,8% e 17% dos atletas (intervalo de confiança com valor médio de 8%) desenvolvem sintomas persistentes, entre eles anosmia/ageusia (30%), tosse (16%), fadiga (9%) e dor no peito (8%).

“Observamos que 3% desenvolvem intolerância ao exercício. Não é algo grave, que ameace a vida, mas no contexto esportivo pode ser um problema. No caso dos atletas de elite, qualquer diferença na preparação pode determinar quem sobe ao pódio, tamanha a concorrência”, comenta Gualano.

Protocolos personalizados

Os protocolos adotados pelas confederações esportivas em geral autorizam o retorno à prática cinco dias após o início dos sintomas causados pelo SARS-CoV-2. Na avaliação de Gualano, porém, o estudo mostra que nem todos os atletas estarão aptos a retomar o treinamento nesse período.

“O ideal é o atleta passar por uma avaliação criteriosa e, em caso de sintomas persistentes, talvez seja necessário modular a carga ou até mesmo adiar o retorno até que o quadro se resolva”, afirma.

Embora estudos anteriores tenham sugerido que a COVID-19 aumentaria o risco de miocardite nessa população, a revisão conduzida pelo grupo da FM-USP não confirmou a hipótese.

“Nos estudos em que havia algum tipo de grupo-controle não foi possível observar uma relação de causalidade entre a infecção e o problema cardíaco. Uma possibilidade é que os atletas já tivessem miocardite, que só foi descoberta por causa dos exames de imagem feitos após a COVID-19. Porém, a ausência de evidência não significa que essa relação não exista. Mais estudos devem ser feitos a respeito”, diz.

Gualano aponta outras lacunas nesse campo do conhecimento que ainda precisam ser preenchidas por futuras pesquisas. Uma delas é o impacto da ômicron e suas subvariantes nos esportistas, uma vez que a maioria dos artigos é anterior ao surgimento das novas cepas do SARS-CoV-2.

“Aparentemente, um número menor de atletas tem nos procurado com sintomas persistentes, mas não sabemos se é por causa da variante, da vacinação ou da imunidade prévia. Também não conhecemos a resposta vacinal às subvariantes da ômicron. Precisamos continuar estudando os atletas nesse novo contexto da pandemia”, argumenta.

O artigo Acute and post-acute COVID-19 presentations in athletes: a systematic review and meta-analysis pode ser lido em: https://bjsm.bmj.com/content/early/2022/05/26/bjsports-2022-105583.
 

Este texto foi originalmente publicado por Agência FAPESP de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original aqui.

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