A França declarou nesta quarta-feira (15/05) estado de emergência na Nova Caledônia, território ultramarino francês no Oceano Pacífico, 1,5 mil quilômetros a leste da Austrália, após violentos protestos de separatistas deixarem ao menos quatro mortos – um deles membro das forças de segurança francesas.
A medida irá durar ao menos 12 dias e dá às forças policiais mais poderes para controlar a situação no arquipélago, incluindo a possibilidade de prisão domiciliar para pessoas consideradas como uma ameaça à ordem pública e a proibição de protestos.
As medidas anunciadas pelo governo francês também incluem o deslocamento de membros das Forças Armadas para a região, toque de recolher noturno e a suspensão do serviço de vídeos TikTok.
Segundo o governo francês, a última vez em que medidas do tipo foram baixadas foi em 1985.
Os protestos, que acontecem desde a semana passada, surgiram após uma reforma constitucional aprovada pelo Parlamento francês que estendeu o direito ao voto nas eleições regionais a franceses que vivem há mais de dez anos no arquipélago.
Até então, além da população originária, esse direito era reservado apenas a imigrantes que viviam no território desde antes de 1998 e aos filhos deles. Ou seja, os residentes que chegaram da França continental ou de qualquer outro lugar nos últimos 25 anos não têm o direito de participar nas eleições lcoais.
O governo francês classifica a exclusão de uma em cada cinco pessoas do voto como "absurda", enquanto os separatistas temem que a medida acabe diluindo a influência do povo originário Kanak, maior etnia do arquipélago, com 41% de seus 270 mil habitantes. O segundo maior grupo, com 24%, são de pessoas de origem europeia – em sua maioria, franceses.
Opositores da reforma constitucional dizem que ela vai beneficiar políticos pró-França e marginalizar os Kanaks, que no passado sofreram sob políticas rigorosas segregacionistas e discriminação.
Escolas e o aeroporto internacional de Nova Caledônia foram fechados. Na capital Nouméa, onde comércios e veículos foram incendiados, a administração francesa impôs um toque de recolher.
Centenas de reforços policiais foram enviados à região, e mais de 130 pessoas teriam sido presas.
Contexto histórico
Há décadas a Nova Caledônia é palco de tensões entre os Kanaks, que buscam a independência, e descendentes de colonizadores, que querem continuar a ser parte da França.
O arquipélago foi anexado pela França em 1853 e usado como colônia penal até o final do século 19. Na década de 1970, a exploração de níquel aumentou as tensões entre o governo francês e Kanaks independentistas – a região é a terceira maior produtora mundial da commodity, usada principalmente na produção de ligas metálicas.
Um acordo de 1998 apaziguou a situação ao prever a autonomia gradual do arquipélago e restringir o direito de voto de imigrantes – medida essa que agora foi relaxada pelo Parlamento francês.
A independência da França, porém, foi rejeitada em três referendos realizados entre 2018 e 2021 – Kanaks, que receberam cidadania francesa em 1957, boicotaram esta última votação sob o argumento de que ela foi realizada no auge da pandemia. Nas primeiras duas votações, a independência foi rejeitada por uma margem estreita de votos, 56,4% e 53%, respectivamente.
O presidente francês, Emmanuel Macron, disse que líderes da Nova Caledônia teriam até junho para negociar um acordo antes que ele sancione a lei.
O território é de crucial importância para o plano de Macron de aumentar a influência francesa no Pacífico, região onde China e Estados Unidos disputam poder e influência comercial e geopolítica.
ra (AP, AFP, dpa, Reuters, ots)