Chamas destruíram casas e oliveiras durante dias na Grécia no verão europeu do ano passado. O fogo devastou uma área maior do que a cidade de Nova York e deixou um rastro de cinzas e luto. Esse foi o maior incêndio florestal já registrado na Europa.
Embora os incêndios florestais sejam um fenômeno natural na região, o aumento das temperaturas e a intensificação dos períodos de seca criam um clima mais seco e propenso ao fogo, fazendo as chamas se espalharem mais rápido e mais ferozmente, além de duraram mais tempo.
Na Europa, assim como no resto do mundo, os incêndios florestais estão ocorrendo com mais frequência e intensidade. Somente em 2023, eles queimaram na União Europeia (UE) uma área pouco maior ao equivalente a duas vezes o tamanho de Luxemburgo, que possui 2.586 km². O fogão causou danos de mais de 4 bilhões de euros (R$ 23 bilhões) e liberou na atmosfera 20 megatoneladas de CO2 – o equivalente a quase um terço das emissões anuais da aviação internacional na UE.
Diante deste cenário, fica a questão se a Europa está preparada para enfrentar o crescente risco de incêndios florestais devido à expectativa de aumento das temperaturas.
"Os incêndios florestais estão se tornando cada vez mais significativos", afirma Balazs Ujvari, porta-voz da Comissão Europeia. "Cada vez mais há situações com as quais os países-membros não conseguem lidar."
Até agora, o foco da resposta da UE tem sido a expansão das capacidades de combate a incêndios por meio do Mecanismo de Proteção Civil do bloco e do programa RescEU, que presta apoio a países que enfrentam catástrofes naturais.
No ano passado, foi duplicada a frota de aviões, helicópteros e bombeiros, com os incêndios na Grécia mobilizando a maior operação de resposta aérea da Europa.
Apenas resposta é pouco
Segundo Ujvari, a UE possui 28 aviões, quatro helicópteros e 556 bombeiros estacionados em quatro países propensos a incêndios. O porta-voz destacou ainda que 600 milhões de euros foram direcionados para a expansão da frota até o final desta década.
Ujvari acrescenta ainda que a União Europeia pode disponibilizar imagens das áreas atingidas feitas pelo sistema de satélites Copernicus para ajudar as autoridades locais no monitoramento e combate a focos de incêndio.
Alguns cientistas e especialistas argumentam, porém, que a UE poderia fazer mais para prevenir os incêndios. Cerca de 90% do orçamento para o combate a incêndios florestais é destino a reposta e apenas 10% para a prevenção, segundo estimativas de Anna Deparnay-Grunenberg, eurodeputada alemã do Partido Verde.
De acordo com Alexander Held, especialista do Instituto Florestal Europeu, a ocorrência de incêndios que são extremamente difíceis de controlar, como os que atingiram Portugal em 2017 e devastaram 500 mil hectares, causando mais de 100 mortes, enfatiza os limites da priorização da resposta.
"A ciência e a experiência nos contam que para prevenir esses desastres não adianta investir no combate ao fogo, porque ele não pode ser combatido. A única coisa que podemos fazer é evitar que eles ocorram ou garantir que eles não queimem numa intensidade além do limite de controle", afirma Held.
O especialista pondera que a UE precisa investir mais em prevenção de incêndios rurais e em soluções baseadas na natureza. "Quanto mais mudanças climáticas observamos, mais deveríamos investir para tornar o ambiente menos inflamável."
Mais manejo florestal
Há muitos métodos disponíveis para uma gestão mais sustentável dos solos e para o aumento da resiliência de florestas, explica Julia Bognar, diretora do programa sobre uso do solo e clima do Instituto para Política Ambiental Europeia.
Isso inclui o desbaste e espaçamento adequado das árvores, a redução da vegetação do solo por meio de queimadas controladas e a introdução de mais animais de pasto, como bois e cabras, que comem arbustos secos, que agem como combustível na propagação de incêndios florestais. Além disso, evitar monoculturas, como as plantações de eucaliptos em Portugal, também tornam as florestas mais resilientes.
"As florestas têm melhor capacidade de armazenar água e prevenir secas com uma maior diversidade de árvores e com árvores mais antigas", acrescenta Bognar.
As abordagens precisam ser costuradas para os climas de cada países, pontua Held, explicando que, em locais mais quentes como o sul da Espanha, isso envolveria a queima controlada em períodos de clima ameno e o estabelecimento de um mosaico de diferentes usos da terra, incluindo a diminuição de pastagens que mantém a biomassa, que se transforma em combustível quando está quente e seco.
"Na Europa Central, a resiliência significa promover florestas de folhas largas, florestas mistas e florestas úmidas e sombreadas", diz Held, acrescentando que medidas técnicas como corta-fogos e zonas de proteção também poderiam ajudar.
O especialista afirma ainda que encorajar a gestão do solo como práticas como agricultura orgânica e silvicultura sustentável também são fundamentais.
Solução de longo prazo
Bognar destaca que cada vez mais práticas de prevenção de incêndios estão sendo compartilhadas na Europa. Elas incluem as diretrizes para a gestão florestal sustentável publicadas em 2003 pela Comissão Europeia. "Mas não há necessariamente um esforço concentrado a nível da UE para pressionar por esse tipo de mudança."
A especialista afirma que repensar a abordagem europeia diante da crescente ameaça de incêndios florestais requer soluções de longo prazo, como o avanço da proposta de um Quadro de Monitoramento Florestal e a implantação da Lei de Restauração da Natureza, que visa promover a resiliência ao fogo aumentando a biodiversidade florestal.
Held também destaca que há alguns fundos que podem ser usados para a prevenção, mas há pouca compreensão e coordenação de como acessar a esses recursos e faltam estratégias nacionais sólidas de prevenção. Uma exceção, porém, é Portugal, ressalta.
Desde os incêndios de 2017, o país mudou sua abordagem para enfatizar a gestão florestal, incluindo o incentivo para a plantação de espécies nativas adaptadas ao fogo, a criação de áreas artificiais com pouca vegetação, que funcionam como barreiras para o fogo, e de zonas de proteção em torno de edifícios em áreas de risco.
A França também tem feito mudanças. O país aprovou uma legislação no ano passado que pune proprietários de terra que falham na limpeza da vegetação rasteira de suas florestas.
Mas, segundo Jesus San-Miguel, pesquisador do Centro de Pesquisa Conjunta da Comissão Europeia, uma barreira fundamental no continente é o fato da Comissão Europeia poder fornecer apenas aconselhamento e apoio. Afinal, os países-membros são os responsáveis pela gestão florestal e prevenção de incêndios.
"Prevenção é um processo lento, menos visível do que o combate ao fogo. Quando há muitos aviões fazendo o trabalho, parece que se está realmente fazendo muito, mas a prevenção deve ser priorizada, pois ela é muito mais barata", acrescenta San-Miguel.
Autor: Holly Young