O embaixador do Gabão, pai de um dos adolescentes abordados por policiais militares em Ipanema, na Zona Sul do Rio, vai levar o caso ao Conselho Nacional de Direitos Humanos nesta semana. A informação foi confirmada pela advogada dos familiares dos jovens. A decisão foi tomada após Polícia Civil concluir o inquérito do caso e apontar que não houve racismo. O episódio aconteceu na noite do dia 3 de julho.
O Conselho Nacional de Direitos Humanos é responsável por fiscalizar e monitorar as políticas públicas de direitos humanos e o programa nacional de direitos humanos. O Conselho também pode expedir recomendações a entidades públicas e privadas envolvidas com a proteção dos direitos humanos.
Três dos quatro adolescentes são negros e filhos de diplomatas estrangeiros. Imagens de câmeras de segurança mostram o momento em que os agentes descem do carro e apontam os fuzis para os menores. Uma nova filmagem interna do prédio mostra ainda que havia um quinto adolescente branco, que não é abordado pelos policiais.
A Polícia Civil vai encaminhar o inquérito ao Ministério Público do Rio. As famílias esperam que o órgão estadual ofereça denúncia contra os policiais pelo crime de racismo e tortura.
Em depoimento, os policiais Luiz Felipe dos Santos Gomes e Sérgio Regattieri Fernandes Marinho destacaram que um estrangeiro abordou os militares no ponto de baseamento em Ipanema afirmando que tinha tido o cordão furtado minutos antes. Uma testemunha confirmou a informação aos policiais e descreveu o grupo de criminosos como sendo jovens. Entre eles, um de camisa branca e outros negros.
O documento destaca que os jovens abordados relataram que não houve palavras ofensivas ou com cunho racial e discriminatório. O relatório final do inquérito cita que os PMs envolvidos não fizeram a abordagem com base na cor da pele.
Para a Polícia, o fato dos militares estarem atrás de suspeitos que foram descritos por vítimas não indica racismo. A delegada destaca, inclusive, que o adolescente branco chegou a ter a parte íntima revistada, local onde segundo a polícia é utilizado por criminosos para esconder objetos.
A família dos adolescentes afirma que eles foram revistados pelo policial, que estava armado e apontando em direção aos jovens. No entanto, o agente de segurança disse em depoimento que a arma estava guardada no momento da revista.
Apesar de já considerar a ação com potencial racista, a advogada dos familiares dos jovens, Raquel Fuzaro, destaca que os policiais chegaram a ameaçar os meninos caso eles estivessem novamente juntos nas ruas da região.
E, posteriormente, mesmo tendo ciência de que ali não havia nenhum tipo de situação irregular, eles ameaçaram os meninos que eles não deveriam sair às ruas, porque eles seriam efetivamente abordados novamente. E pior, iria acontecer um mal maior, então eles impuseram aos meninos uma restrição em relação à sua cor de pele. Então isso é uma abordagem sim racista. Aguardamos que o Ministério Público do Rio de Janeiro ofereça denúncia contra os policiais pelo crime de racismo.
Os investigadores checaram a informação do estrangeiro furtado com o material gravado pela câmera corporal instalada no uniforme dos outros policiais que estavam na base de policiamento, os Pms envolvidos na aborgagem não utilizavam o equipamento.
Um boletim interno da PM divulgado em setembro de 2022 indica que as câmeras corporais portáteis devem ser utilizadas obrigatoriamente por policiais militares que estejam escalados para o serviço ostensivo, o que não era o caso dos dois que estavam escalados para supervisão.
Dois dias depois do episódio, o Itamaraty enviou um pedido formal de desculpas aos embaixadores do Canadá, do Gabão e de Burkina Faso.
Na ocasião, o governador do Rio, Cláudio Castro, disse que o Ministério das Relações Exteriores "avacalhou" a Polícia Militar. O político disse que não houve diálogo com o Governo do Estado para tratar sobre o assunto, apesar de o Itamaraty ter enviado um ofício ao Governo do Rio. Ele ainda chegou a dizer que é a PM que protege os filhos dos integrantes do Ministério das Relações Exteriores quando eles estão no Rio.
Procurados, o Itamaraty e o Ministério Público ainda não se manifestaram. Em nota, a Polícia Militar informou que vai ser instaurado um Inquérito Policial Militar de acordo com a conclusão do inquérito da Polícia Civil.