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Alemanha tem recorde de crimes de cunho político e religioso

Casos motivados por extremismo, antissemitismo, racismo, entre outros, chega, pela primeira vez, a 60 mil. Dados refletem agravamento das tensões políticas e sociais.

Por Deutsche Welle

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O Departamento Federal de Investigações (BKA) e o Ministério do Interior da Alemanha divulgaram nesta terça-feira (21/05) o relatório anual Crimes de Motivação Política, com o registro de delitos de cunho sócio-político ou religioso em 2023.

Muitas vezes, as duas motivações andam juntas, como mostra o relatório. Os efeitos dos ataques terroristas do Hamas em Israel em 7 de outubro de 2023 e a subsequente reação israelense que resultou na guerra na Faixa de Gaza repercutiram com força na Alemanha.

"A situação no Oriente Médio teve impacto direto na radicalização na Alemanha em todos os níveis, com o aumento de atos antissemitas, protestos nas ruas e o crescimento dos crimes de motivação política. O potencial para agravamentos é enorme", resumiu o diretor do BKA, Holger Münch, ao apresentar os dados de 2023 em Berlim, ao lado da ministra alemã do Interior, Nancy Faeser.

"Aqueles que semeiam a raiva e o ódio em nossa sociedade se tornaram mais ruidosos. O ódio na internet continua explodindo", afirmou a social-democrata Faeser.

Mais de 60 mil crimes

Pela primeira vez, o número de todos os crimes registrados superou o patamar de 60 mil, o que representa um aumento de 1.100 casos em comparação a 2022 e mais do que o dobro de dez anos atrás.

A maioria dos casos se refere aos chamados crimes de propaganda, que representam um terço do total nas estatísticas atuais. Isso inclui o uso de símbolos de organizações inconstitucionais, como a suástica nazista. A incitação ao ódio, insultos e danos a propriedades ficam entre 13% e 15%.

Queda da violência após a pandemia

O total dos atos violentos, porém, caiu quase 12%, chegando a 3.561. Para Münch, isso não é surpresa. Segundo ele, o motivo é que em 2022 muitos crimes ainda eram cometidos em associação aos protestos contra as restrições impostas durante a pandemia de covid-19. Desde o fim das medidas, o número de manifestações caiu significativamente.

O maior perigo continua sendo o extremismo de direita, responsável por quase a metade dos crimes cometidos. "Em nenhuma outra área o número de vítimas é tão alto", observou Faeser, se dizendo particularmente preocupada com os atos de violência contra autoridades e políticos.

Quase todos os partidos políticos alemães foram afetados por isso, incluindo o ultradireitista Alternativa para a Alemanha (AfD), que é vigiado pelo Departamento Federal de Proteção da Constituição (BfV), a agência de inteligência interna do país, por suspeita de extremismo político.

Ultradireita estimula clima de violência

O ataque ao candidato do Partido Social-Democrata (SPD) às eleições europeias Matthias Ecke, em Dresden, há poucas semanas, deixou o país horrorizado. Faeser, que esteve com ele recentemente, relatou que Ecke "não se permite ser intimidado ou silenciado, assim como muitos outros que viveram essas hostilidades e permanecem fortes, não importa a qual partido pertençam, aos Verdes, SPD ou AfD".

A ministra do Interior não deixa dúvidas sobre onde estão os instigadores por trás da violência política. "Aqueles que, especialmente nos grupos da direita, provocam um clima de violência com hostilidades totalmente desinibidas, carregam uma responsabilidade considerável por tudo isso".

Faeser ressaltou que "é importante proteger os atingidos pelos crimes de motivação política, aqueles que sentem o racismo, o ódio aos judeus, a violência islamista e os extremismos de direita e de esquerda".

Extremismo de esquerda

A ministra disse que essa violência também é dirigida à sociedade aberta e livre. "Esses são atos que com frequência se voltam contra a dignidade humana e a democracia". "Utilizamos todos os nossos instrumentos, do monitoramento por meio da inteligência a investigações intensas", esclareceu.

Ao comentar sobre a cena islamista no país, ela pontuou que "as autoridades de segurança agiram diversas vezes de maneira antecipada nos últimos meses para evitar ataques".

A cena da extrema esquerda também vem sendo cada vez mais acompanhada de perto pelas autoridades. Segundo Faeser, um em cada quatro extremistas de esquerda são classificados como tendo tendência à violência. "O limite de suas inibições vem caindo ao ponto de atacarem oponentes políticos e policiais em atos de extrema brutalidade."

Agravamento das tensões políticas e sociais

O diretor do BKA descreve os desenvolvimentos recentes como "ameaçadores". O recorde no número de casos demonstra o agravamento das tensões políticas e sociais em meio à sobreposição de crises e conflitos diferentes.

"Vemos atualmente o quão rápido as emoções, o ódio e a agitação, assim como a violência real nas ruas da Alemanha, podem progredir", observou Münch.

A Associação de Centros de Aconselhamento aos Afetados pela Violência de Extrema Direita, Racismo e Antissemitismo (VBRG) mantém contato constante com as vítimas, além de realizar seus próprios balanços.

Em 2023, a entidade, que age nos 16 estados alemães, documentou 2.589 crimes – um aumento de mais de 20%. Judith Porath, da organização Perspectiva das Vítimas, em Brandemburgo, relatou 1.402 casos envolvendo danos corporais.

Ela observou que crianças e jovens também são vítimas dos crimes de motivação política. De todos os crimes registrados, 585 foram cometidos contra menores de idade. Segundo Porath, esses dados revelam "um desenvolvimento muito grave que ilustra como as situações de ameaça pioraram, em particular, para os grupos mais vulneráveis".

Os criminosos advêm de todas as faixas etárias e são, com frequência, abertos em relação aos seus crimes.

A diretora do centro de aconselhamento em Brandemburgo cita como exemplo a tentativa de assassinato de uma jovem negra em Hamburgo. "Seu vizinho extremista de direita, que havia anunciado seu crime de antemão, atirou com um fuzil contra ela através da porta do apartamento."

A disseminação do discurso antirrefugiados e a incitação ao racismo estão entre as principais causas da violência. Segundo Porath, isso vem sendo incensado por partidos de direita como a AfD, entre outros.

Autor: Marcel Fürstenau

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